Gastroenterologia
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Dispepsia: avaliação, causa, como diagnosticar e tratamento

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Equipe medclub
Publicado em
14/8/2024
 · 
Atualizado em
14/8/2024
Índice

É válido introduzir esse artigo mencionando que a dispepsia não é uma doença, mas sim um sintoma, relacionado a uma gama de patologias, com variadas fisiopatologias. Além disso, existem mais de um tipo de dispepsia, podendo ser funcional ou secundária a alguma causa orgânica subjacente. Diante de sua relevância clínica, é essencial que médicos e estudantes saibam conduzir adequadamente pacientes que sofrem com esse sintoma. 

O que é a dispepsia?

Dispepsia é um sintoma que causa um desconforto na região epigástrica, que pode ser descrita como um processo de indigestão, empachamento, queimação, plenitude pós-prandial, saciedade precoce ou  gases. 

Apesar de geralmente não estar relacionado a doenças de grande gravidade, é um sintoma comum, podendo acometer até 20% da população geral. Além disso, muitos pacientes acabam não buscando atendimento médico e não são tratados adequadamente, causando muitos prejuízos na qualidade de vida. 

A dispepsia poderá ser secundária a uma doença orgânica, que representa cerca de 20% a 25% dos casos de dispepsia, ou poderá ser do tipo funcional (quando é idiopática ou não ulcerosa), representando de 75% a 80% dos casos. 

O que causa a dispepsia?

Como já foi dito anteriormente, 80% dos casos são idiopáticos, porém os outros 20% estão relacionados a uma doença de base. Sendo assim, pacientes podem apresentar dispepsia devido a uma série de causas. Dentre as principais, podemos citar: 

  • Doença gastrointestinal não maligna: úlcera péptica, infecção por Helicobacter pylori, pancreatite crônica, doença de crohn; síndrome do intestino irritável, doença celíaca, gastrite crônica, coledocolitíase, colecistite aguda, disfunção do esfíncter de Oddi e gastroenterite eosinofílica; 
  • Malignidade: adenocarcinoma gástrico; adenocarcinoma pancreático; carcinoma hepatocelular e colangiocarcinoma 

Além disso, devemos prestar atenção na caracterização da queixa, pois a forma como ela é descrita nos leva mais para algumas possíveis causas em relação a outras. Por exemplo: 

  • Quando a queixa estiver mais relacionada com um desconforto pós-prandial: podemos pensar mais em gastroparesia; isquemia mesentérica crônica; cálculos biliares; esofagite eosinofílica; isquemia mesentérica aguda e síndrome da artéria mesentérica superior. 
  • Se a queixa incluir azia ou refluxo: é importante considerar doença do refluxo gastroesofágico.

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Avaliação inicial de pacientes com dispepsia 

Uma avaliação detalhada é extremamente importante para que consiga chegar em um diagnóstico correto, ficando atento principalmente às características de alarme para possíveis casos mais graves, como de malignidade gastroesofágica. 

A avaliação inicial consiste na realização da coleta da história, realização do exame físico e avaliação laboratorial. 

História 

A coleta de uma história detalhada é importante para determinar causas subjacentes e encontrar com prontidão aqueles pacientes com características de alarme. Abaixo, podemos citar pontos frequentemente encontrados em anamneses e o que eles sugerem: 

  • Uso de aspirina e outros AINEs: sugere dispepsia de AINES e úlcera péptica 
  • Relato de azia e/ou regurgitação: sugere doença do refluxo gastroesofágico 
  • Presença de perda de peso, anorexia, vômito, anemia, odinofagia, além de passado familiar de câncer gastrointestinal: sugere presença de malignidade gastroesofágica
  • Presença de dor abdominal intensa e episódica, com duração em torno de 30 minutos, somada a náuseas e vômitos: sugere colelitíase sintomática 
  • Presença de náuseas e vômitos somada a dor abdominal em região superior e persistente, principalmente com fatores de risco positivos: sugere gastroparesia 

Exame físico 

Muitas vezes, o exame físico de pacientes com dispepsia praticamente não apresenta alterações. Entretanto, sua realização é importante, pois ela poderá identificar a presença de uma sensibilidade epigástrica, comum nos quadros de dispepsia. 

Entretanto, apenas a identificação de sensibilidade epigástrica não ajudará a definir se a dispepsia é do tipo orgânica ou funcional. Ademais, é importante que avalie a presença ou não do sinal de Carnett, para determinar se a dor é proveniente da parede abdominal ou das vísceras subjacentes. 

ATENÇÃO! A manobra de Carnett consiste na palpação do abdome procurando por dor, primeiro com a musculatura abdominal relaxada e depois contraída. Assim, quando é flagrado uma dor com o abdome relaxado que desaparece com a contração, nos sugere que a dor seja visceral. 

Realização do teste de Carnett. Fonte: Mayo clinic proceedings 
Realização do teste de Carnett. Fonte: Mayo clinic proceedings 

Ainda no exame do abdome, deve-se ficar atento na palpação de possíveis massas abdominais ou epigástricas.; a presença de abdome ascítico pode indicar carcinomatose peritoneal e a ausculta de respingos de sucussão podem indicar retardo no esvaziamento gástrico ou obstrução mecânica.

 Além disso, é importante verificar outros achados informativos, como se há linfadenopatia, supraclavicular e periumbilical nos casos de câncer gástrico, e icterícia, que pode estar relacionado com a possibilidade de metástase hepática.

Exames laboratoriais 

Dentre os exames complementares, os exames laboratoriais são importantes para identificar características de alarme, como anemia por deficiência de ferro, além de doenças que podem estar relacionadas com a dispepsia, como diabetes e hipercalcemia. Por isso, é válido solicitar hemogramas de rotina e testes de função hepática, lipase sérica e amilase

Como diagnosticar a dispepsia?

A abordagem diagnóstica será baseada na apresentação clínica, na idade do paciente e na presença de características de alarme. 

A avaliação endoscópica em pacientes com dispepsia geralmente é positiva, porém não é recomendado para qualquer pessoa. Em uma visão geral, será indicado a realização de uma endoscopia digestiva alta para pacientes que apresentam dispneia e algum dos seguintes fatores: 

  • Idade ≥ 50-60 anos 
  • ≥ 1 dos seguintes recursos de alarme: perda de peso não intencional; odinofagia; disfagia; sangue nas fezes ou no vômito; anemia por deficiência de ferro; vômito persistente; massa abdominal palpável e adenopatia anormal
  • História familiar de malignidade gastrointestinal superior 

Na endoscopia, deverá ser feita biópsias do estômago para descartar H. pylori. Para aqueles pacientes que não fizeram a endoscopia, será indicado a testagem e tratamento para H. pylori

Vale salientar que, estudos indicaram que o rendimento diagnóstico da endoscopia digestiva alta são maiores com a idade, enquanto que na ausência de sinais de alerta, é improvável que a dispepsia esteja relacionada com uma causa preocupante. Diante disso, é válido ressaltar que algumas diretrizes defendem que a endoscopia deve ser feita seletivamente naqueles com mais de 60 anos, diante de evidências de que características de alarme individuais têm baixo valor preditivo positivo para malignidade. 

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Tratamento da dispepsia

Nos casos em que a Biópsia e o teste para H. pylori evidencie infecção ativa da bactéria, o paciente deve ser submetido a tratamento com terapia de erradicação. Para aqueles que tiveram o teste de H.pylori negativo ou sintomático após terapia de erradicação da bactéria, está indicado o tratamento empírico com Inibidor da Bomba de Prótons (IBP), por aliviar os sintomas de dispepsia.

Para aqueles com testagem negativa para H.pylori e que apresentem uma resposta inadequada a um IBP, poderá ser indicado o uso de Antidepressivos tricíclicos (Amitriptilina, desipramina e imipramina), ou ainda o uso de antidepressivo tetracíclico mirtazapina se os sintomas persistirem com o uso do tricíclico. 

Mesmo após a utilização dos tratamentos anteriores, o paciente poderá persistir com os sintomas. Nesse caso, ele poderá apresentar uma infecção persistente por H. pylori, apresentar um diagnóstico alternativo ou ainda ter dispepsia funcional, que representa a grande maioria dos casos. 

Mediante sintomas persistentes, o paciente terá que ser cuidadosamente reavaliado, fazendo, ou repetindo se já tiver feito, endoscopia digestiva alta com biópsia para H. Pylori, além da realização de culturas e testes de sensibilidade para aqueles que já foram tratados para a infecção. 

Para os casos em que não se encontre infecção da H. pylori, deverá ser feito exames complementares e exames de imagem direcionados para o sintoma persistente do indivíduo. Caso um diagnóstico diferencial não seja identificado, sua dispepsia deve ser classificada como funcional

Conclusão 

A dispepsia é uma queixa bastante multifacetada e que requer uma abordagem clínica cuidadosa para um diagnóstico preciso e tratamento eficaz. Compreender a distinção entre dispepsia funcional e orgânica é crucial. Para isso, a avaliação inicial deve ser detalhada, incluindo história clínica, exame físico e exames laboratoriais, atentos às características de alarme para condições mais graves. O tratamento varia conforme a etiologia, com terapias direcionadas para H. pylori, inibidores de bomba de prótons e, em casos refratários, antidepressivos. Reavaliações  serão necessárias em casos de sintomas persistentes, a fim de que ocorra uma melhor conduta e ajuste terapêutico individualizado para o paciente em questão. 

Continue aprendendo:

FONTES:

  • DynaMed. Dispepsia – Abordagem ao Paciente. Serviços de informação EBSCO. 
  • Ford AC, Marwaha A, Sood R, Moayyedi P. Prevalência global e fatores de risco para dispepsia não investigada: uma meta-análise. Intestino 2015; 64:1049.
  • Talley NJ, Vakil NB, Moayyedi P. Revisão técnica da associação gastroenterológica americana sobre a avaliação da dispepsia. Gastroenterologia 2005; 129:1756.
  • SILVA, Fernando Marcuz. Dispepsia: caracterização e abordagem. Revista de Medicina, v. 87, n. 4, p. 213-223, 2008.
  • PASSOS, Maria do Carmo Friche. Dispepsia funcional. RBM rev. bras. med, 2012.

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