Por: Ellen Kosminsky
A transfusão é uma atividade exclusiva do médico. Apesar de ser um procedimento seguro, apresenta riscos e, por isso, sua indicação não pode ser apenas baseada em dados laboratoriais, devendo esses serem analisados em conjunto com os critérios clínicos do paciente. Esse artigo pretende expor as principais indicações para esse procedimento.
O que são hemocomponentes e hemoderivados?
Os hemocomponentes são os produtos da coleta do sangue, após serem submetidos a processos físicos para extração de um componente, são eles:
- Plasma rico em plaquetas (PRP);
- Concentrado de hemácias (CH);
- Concentrado de plaquetas (CP);
- Plasma fresco congelado (PFC);
- Plasma de 24 horas (P24); e
- Crioprecipitados (CRIO).
Já os hemoderivados são os produtos obtidos do fracionamento do plasma, através de processos físicos e químicos, são eles:
- Albumina;
- Globulinas; e
- Concentrado de fatores de coagulação.
Cuidados antes da transfusão de sangue
Para mais, são necessários alguns cuidados gerais antes de realizar a transfusão. Assim, deve-se primeiramente realizar a inspeção da bolsa de sangue e, em caso de presença extensa de coágulos, como na imagem abaixo, por exemplo, considera-se que a bolsa está inadequada para realizar o procedimento.
Além disso, deve-se evitar apertar a bolsa com os hemocomponentes, devido ao risco de hemólise das células. E mais, não é permitido adicionar soluções aos hemocomponentes. Assim, não se deve utilizar o mesmo acesso venoso central que está sendo utilizado para infusão de noradrenalina, por exemplo, também pelo maior risco de hemólise. A única solução que pode ser infundida em conjunto com o hemocomponente é a solução fisiológica a 0,9%.
Já no concentrado de plaquetas, são aceitáveis colorações até a tonalidade dourada. Todavia, caso o CP apresente coloração mais alaranjada, avermelhada ou amarronzada, a amostra é considerada inadequada, e não deve ser transfundida para o paciente.
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Quando indicar um concentrado de hemácias?
O concentrado de hemácias é indicado em casos em que se faz necessário o aumento rápido da capacidade do transporte de oxigênio, em pacientes com diminuição dos níveis de hemoglobina. Observe a tabela abaixo com as indicações gerais de transfusão de concentrado de hemácias:
Entretanto, para pacientes apresentando síndrome coronariana aguda (incluindo a angina estável) e infarto agudo do miocárdio, as indicações de transfusão do CH são essas:
Já no contexto das hemorragias agudas, a transfusão do concentrado de hemácias é indicada para pacientes com sinais claros de perdas sanguíneas( ≥ 35%), bem como para aquelas com sinais de instabilidade evidente, como a diminuição da perfusão, taquicardia, hipotensão e alteração do nível de consciência.
Por fim, espera-se que uma unidade eleve o hematócrito em 3%, e a hemoglobina em 1 g/dL. O tempo de transfusão deve durar em torno de 2 a 4 horas, e deve ser respeitado porque, em caso de infusão rápida, o paciente corre risco de uma sobrecarga volêmica. Já nos casos de infusão lenta, há maiores chances de infecções bacterianas.
Quando indicar o concentrado de plaquetas?
O concentrado de plaquetas (CP) pode ser obtido através da aférese, definida pela separação dos hemocomponentes celulares e solúveis do sangue através da centrifugação. Ou ainda, através da uma unidade de sangue total, denominada unidade randômica de CP. O seu tempo de infusão deve variar entre 30 a 60 minutos.
A principal diferença entre a unidade randômica e a aférese são a quantidade de plaquetas por bolsa. Uma unidade randômica contém 5.5 x 10¹⁰ plaquetas em 50 a 60 mL de plasma, devendo ser prescrito 1 unidade para cada 10 kg. Assim, espera-se que cada unidade randômica eleve as plaquetas do paciente em 5 a 10.000/µL.
Já a unidade de CP por aférese contém 3 x 10¹¹ plaquetas em 200 a 300 mL de plasma, o que equivale a 6 a 8 unidades de concentrado de plaquetas randômicas. Dessa forma, espera-se que 1 unidade eleve as plaquetas em 50 a 100.000/µL. Por isso, prescreve-se 1 unidade de CP por aférese caso o paciente > 55 kg e, caso seu peso seja < 55 kg, prescreve-se apenas ½ unidade.
Assim, indica-se o CP em pacientes com hemorragias agudas e valores < 50.000/µL. Entretanto, caso o paciente apresente hemorragias pulmonares, no sistema nervoso central ou hemorragias oftalmológicas deve-se realizar a transfusão caso seus níveis plaquetários sejam < 100.000/µL.
Para mais, está indicada a transfusão profilática para todos os pacientes com plaquetopenia secundária à déficit de produção, quando o valor for < 10.000/µL. Ou ainda, quando o indivíduo apresentar plaquetas < 20.000/µL e pelo menos um dos seguintes fatores de risco:
- 1) Febre;
- 2) Sepse;
- 3) Manifestações hemorrágicas menores;
- 4) Esplenomegalia;
- 5) Hiperleucocitose (> 30.000/ µL), e;
- 6) Portadores de outra anormalidade na hemostasia.
E mais, também está indicada a transfusão profilática nos indivíduos com plaquetopenias crônicas secundárias a um déficit de produção, como a anemia aplásica, por exemplo. Nesses casos, é sempre indicada quando os níveis plaquetários são menores do que 5.000/µL.
Além disso, pacientes com plaquetopenias crônicas e valores < 10.000/µL, associados a febre e/ou história de hemorragia recente, também devem receber a transfusão profilática. Já para aqueles com plaquetopenia por consumo, em situação de coagulação intravascular disseminada (CIVD) a transfusão profilática não está indicada. Sendo recomendada apenas quando apresentar sangramento ativo, com objetivo de manter os níveis plaquetários > 20.000/µL.
Por fim, as principais indicações de transfusão de concentrado de plaquetas para pessoas que irão realizar algum procedimento médico estão citadas na tabela abaixo. As principais contraindicações são a púrpura trombocitopênica autoimune (PTI), púrpura trombocitopênica trombótica (PTT) e a trombocitopenia induzida por heparina.
Quando indicar a transfusão de plasma fresco congelado (PFC)?
As principais indicações para transfusão de PFC estão dispostas abaixo. O PFC apresenta quantidades normais de todos os fatores de coagulação, antitrombina e ADAMTS13. Assim, administra-se 10 a 20mL/kg/dia, com tempo máximo de infusão de até 60 minutos.
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Crioprecipitados: como utilizar e como indicar?
Os crioprecipitados (CRIO) são retirados a partir do plasma fresco congelado, e armazenados em volumes de 20 a 30 mL, são componentes do CRIO:
- Fibrinogênio (150 a 250 mg);
- Fator VIII (80 a 150 UI);
- Fator de Von Willebrand (150 UI);
- Fator XIII (50 a 75 UI).
Utiliza-se 1U a cada 10 kg de peso do paciente, com tempo de infusão entre 30 a 60 minutos. As indicações para o crioprecipitado estão dispostas na tabela abaixo:
Intercorrência na transfusão de hemocomponentes
As reações transfusionais são definidas pela presença de qualquer intercorrência ocorrida durante a transfusão de hemocomponentes, seja durante ou após sua infusão. Entretanto, a reação transfusional é comumente imediata, ou seja, ocorre desde o início da transfusão ou em até 24 horas após o procedimento.
Assim, a presença de alguns sintomas clínicos devem elevar as suspeitas para uma possível reação, são elas a presença de febre e/ou calafrios, náuseas com ou sem vômitos e dor no local de infusão, região torácica ou lombar. E mais, a presença de hipertensão ou hipotensão, e sintomas respiratórios como dispneia, taquipneia, hipóxia ou sibilos.
Por fim, a presença de sinais e sintomas como o prurido, a urticária, o exantema e o edema generalizado ou local também podem estar presentes. Observe a tabela abaixo com as principais intercorrências durante a transfusão de hemocomponentes.
Em caso de qualquer uma dessas reações, deve-se suspender a transfusão imediatamente, mantendo-se o acesso venoso com soro fisiológico a 0,9%. A única exceção a essa regra é a reação alérgica leve, em que a suspensão da transfusão pode ser apenas temporária. Caso o paciente apresente uma reação alérgica localizada, pode-se utilizar o anti-histamínico e iniciar novamente a transfusão.
Conclusão
A transfusão é um procedimento que apresenta riscos. Por isso, o reconhecimento das principais indicações para a transfusão dos hemocomponentes e hemoderivados são de conhecimento fundamental para todos o médico generalista, a fim de não expor o paciente a riscos desnecessários, bem como para indicar corretamente o procedimento em um paciente que necessite dessa transfusão.
Continue aprendendo:
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FONTES:
- Guia para uso de hemocomponentes / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Especializada e Temática. – 2ª. Ed., 1. Reimpr. – Brasília : Ministério da Saúde, 2015.
- Clinical Practice Guidelines From AABB: Red Blood Cell Transfusion Thresholds and Storage. JAMA. 2016;316(19):2025.
- Covas, Ubiali e De Santis. Manual de Medicina Transfusional – 2ª ed. Editora Atheneu, 2014.
- Robinso, S et al. The administration of blood components: a British Society for Haematology Guideline. Transfusion Medicine, 2018, 28, 3-21.
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