Cardiologia
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Parada cardiorrespiratória: passo a passo da ressuscitação cardiopulmonar 

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Equipe medclub
Publicado em
21/8/2024
 · 
Atualizado em
21/8/2024
Índice

A Parada Cardiorrespiratória (PCR), também conhecida como parada cardíaca, é algo que pode assustar muitos profissionais de saúde, principalmente aqueles mais inexperientes, pois se trata de um ocorrido que demanda bastante agilidade e conhecimento. A PCR pode acontecer dentro ou fora do ambiente hospitalar, e conhecer o passo a passo mais indicado de como manejar uma parada é essencial para todo médico. 

O que é a parada cardiorrespiratória?

A PCR pode ser definida como uma cessação súbita do bombeamento cardíaco, o que resulta em um colapso hemodinâmico. Quando o coração parar de bater, ou a vítima irá evoluir para óbito (morte súbita pulmonar) ou haverá possibilidade de retorno espontâneo da circulação por meio da Ressuscitação cardiopulmonar (RCP), nesse caso, é definido que o paciente entrou em PCR. 

Aproximadamente metade das PCR acontecem em indivíduos com menos de 65 anos e 70% delas ocorrem em ambiente extra-hospitalar. O problema disso é que essas paradas poderão acontecer em ambientes extremamente adversos, diferentemente de um ambiente controlado, com recursos e profissionais preparados, como em uma sala vermelha ou uma UTI. 

Infelizmente, nos deparamos com um contexto em que a população brasileira não sabe lidar com uma situação de parada cardiorrespiratória e nem ao menos sabe o número de entidades importantes, como o SAMU (192) e os bombeiros (193). Ademais, não é difícil encontrar equipes em ambientes hospitalares que desconhecem os protocolos de RCP e que não agem de forma eficaz, sincronizada e técnica, como deveria. 

Causas da parada cardiorrespiratória

As causas mais comuns de parada cardiorrespiratória são as patologias cardíacas. Dentre elas, a mais comum é o Infarto Agudo do Miocárdio (IAM). Outras causas cardíacas menos comuns são: cardiomiopatia hipertrófica, síndrome de Brugada, síndrome do QT longo, síndrome do QT curto e cardiomiopatia arritmogênica do ventrículo direito

Dentre as causas metabólicas, a mais comum do PCR é a hipercalemia, muito relacionada a pacientes com insuficiência renal. Geralmente, as paradas cardíacas causadas por hipercalemia ocorrem em um ritmo não chocável. 

CAUSAS DA PARADA CARDIORRESPIRATÓRIA
Causa geral Causa específica Patologia/agente
Cardíacas Infarto agudo do miocárdio
Cardiomiopatia hipertrófica
Disfunção valvar
Doença arterial coronariana
anormalidades estruturais cardíacas






Respiratória
Hipoventilação Disfunção do sistema nervoso central
Doença neuromuscular
Tóxicos
Encefalopatia metabólica
Obstrução de via aérea superior Disfunção do sisteme nervoso central
Corpo estranho
Infecção de via aérea superior
Neoplasia
Disfunção pulmonar Asma/doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC)
Edema agudo pulmonar
Tromboembolismo pulmonar
Pneumonia




Circulatória
Obstrução mecânica Pneumotórax hipertensivo
Tamponamento cardíaco
Tromboembolismo pulmonar
Hipovolemia Hemorragia
Tônus vascular Sepse
Neurogênico
Metabólico Anormalidades eletrolíticas Hipo/hipercalemia
Hipo/hipermagnesemia
Hipocalcemia





Tóxicos
Medicações Antiarrítimico
Betabloqueador
Bloqueadores de canal de cálcio
Antidepressivo tricíclico
Drogas recreativas Cocaína
Heroína
Crack
Toxinas Monóxido de carbono
Cianeto
Ambiental Arritmias
Hipoxemia
Eletrocussão
Hipotermia ou hipertermia
Afogamento
Causas não traumáticas de parada cardiorrespiratória. Fonte: Emergências clínicas: Abordagem prática Fmusp

Nos casos em que a vítima se encontra em PCR, ele estará irresponsívo. Por isso, determinar a causa da parada no atendimento inicial pode ser um grande desafio. É necessário ficar atento ao exame físico, pois ele nos dará indícios dessa causa: 

Sinal visto em exame físico Sugestão de causa da PCR
Pacientes portadores de doença renal crônica Sugestivo de hipercalemia
Pacientes com cicatriz de esternotomia de provável revascularização cardíaca Possível coronariopatia ou tamponamento cardíaco
Paciente pálido e com distensão abdominal Hipovolemia (hemorragia)
Distensão jugular Tromboembolismo pulmonar, tamponamento cardíaco, pneumotórax hipertensivo
Via aérea com secreções Obstrução de via aérea superior e hipóxia
Marca de aplicações com agulha Uso de drogas ou pacientes em uso de insulina
Queimaduras de região distal Eletrocussão
Sinais encontrados em pacientes em PCR e possíveis causas. Fonte: Emergências clínicas: Abordagem prática Fmusp

É preciso dizer que a análise laboratorial é de uso limitado durante uma PCR. Entretanto, a coleta poderá ser feita para descartar causas reversíveis, como hipercalemia. Na prática, o médico poderá fazer o tratamento de forma empírica, desde que exista suspeita clínica. Após a ressuscitação, outros exames laboratoriais podem ser feitos para confirmar o diagnóstico. 

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Tipos de parada cardiorrespiratória

A parada cardiorrespiratória poderá acontecer em quatro ritmos: Fibrilação Ventricular (FV), Taquicardia Ventricular Sem pulso (TVSP), Atividade Elétrica Sem Pulso (AESP) e Assistolia.  FV e TVSP são os ritmos chocáveis, enquanto que a AESP e a assistolia são ritmos não chocáveis. 

Fibrilação ventricular

Patologia cardíaca em que o ventrículo entra em um estado caótico e passa a contrair de forma desordenada e ineficaz. É o distúrbio cardíaco mais comum nos dois primeiros minutos de um PCR, podendo evoluir rapidamente para assistolia.

Taquicardia Ventricular Sem Pulso 

É uma arritmia de prognóstico grave, caracterizada pela presença de 3 ou mais extrassístoles e uma frequência ventricular superior a 120 bpm. Ela frequentemente prenuncia a instalação de uma fibrilação ventricular.

Assistolia

Patologia marcada por uma arritmia sem ritmo cardíaco algum.

Atividade Elétrica Sem Pulso

Nesse caso, a musculatura cardíaca apresenta atividade elétrica, porém, com batimentos incapazes de entrar em um ritmo sinusal. 

Imagem ilustrativas mostrando os ritmos de PCR
Ritmos de PCR. Fonte: American Heart Association, 2020

Vale lembrar que, a cada minuto de um ritmo chocável sem desfibrilação diminui em torno de 10% a chance de sobrevivência. Após 12 minutos, a chance fica em torno de 0% a 5%. 

Como identificar?

Para que ocorra uma identificação correta de uma parada cardiorrespiratória, deve-se abordar o paciente checando se ele: 

Apresenta ausência de resposta

  • Após chamado e toque vigoroso nos dois ombros. 

Apresenta ausência de pulso carotídeo ou femoral

  • Checar sempre os pulsos centrais (carotídeo ou femoral)
  • Se houver dúvida ou se o pulso não tiver sido detectado em até 10 segundos, a RCP deverá ser iniciada. 

Após identificar a parada cardiorrespiratória, deve-se iniciar rapidamente o atendimento por meio do Suporte Básico de vida (SBV).

Passo a passo para realizar a ressuscitação cardiopulmonar

A realização da ressuscitação cardiopulmonar vai ser diferente se a vítima se encontra em um ambiente hospitalar ou fora dele. Quando ela está fora do ambiente hospitalar, recomenda-se a realização do Suporte Básico de Vida (SBV), que corresponde a uma sequência de manobras com o objetivo de que a pessoa retorne com a circulação espontânea antes do Suporte Avançado de Vida (SAV). No SAV, será possível implantar dispositivos de via aérea avançada, infusão de medicações e parâmetros de monitorização. 

Suporte Básico de Vida 

Nos adultos, o SBV é formado por uma cadeia de sobrevivência que pode ser representada pelo mnemônico C-A-B-D

C

  • Checar segurança 
  • Checar responsividade 
  • Chama ajuda 
  • Checar pulso 
  • Compressões torácicas de qualidade 

A

  • Abrir vias aéreas 

B

  • Boas ventilações 

D

  • Desfibrilação precoce 

A seguir, vamos destrinchar um pouco mais sobre alguns desses passos: 

Checar a segurança

Apesar de subestimado por muitos, esse primeiro passo é bastante importante. Quando o socorrista não checa a segurança, não estando com EPIs ou fazendo a sequência da RCP em um lugares arriscados, ele poderá passar a ser também uma vítima. 

Checar responsividade

Como foi dito anteriormente, a responsividade da vítima deverá ser feita a partir de chamado e toque vigoroso nos dois ombros.

Chamar Ajuda 

A pessoa jamais poderá esquecer de contactar um serviço local de emergência, como o SAMU (192). Além disso, muitos locais públicos, como praças e shoppings com grande circulação de pessoas, são obrigados a portarem um DEA. Se ele estiver disponível, você poderá solicitá-lo para ser utilizado.

Foto de um Desfibrilador Automático Externo (DEA).
Foto de um Desfibrilador Automático Externo (DEA). Fonte: Ultraseg 
Checar Pulso 

Sempre priorizar a checagem dos centrais: carotídeo ou femoral. Se houver dúvida ou se o pulso não tiver sido detectado em até 10 segundos, iniciar as compressões torácicas. 

Compressões torácicas de qualidade 

O rápido início das compressões torácicas é muito importante, pois possibilita maiores chances de obter retorno da circulação espontânea e uma recuperação neurológica. 

O local da compressão deverá ser na ½ inferior do esterno, com a palma da mão dominante sob o dorso da mão não-dominante, dedos entrelaçados e braços completamente estendidos, perpendiculares ao tórax do paciente. A velocidade das compressões deverá ser de 100 a 120 por minuto, minimizando o máximo de interrupções possíveis entre as compressões. 

Vale salientar que o tórax deverá ser comprimido em torno de 5 a 6 cm e o socorrista não deve se apoiar no tórax do paciente, permitindo uma expansão torácica após cada compressão. 

Imagem ilustrativa mostrando o posicionamento correto dos braços para compressões torácicas no adulto
Posicionamento correto dos braços para compressões torácicas no adulto. Fonte: American Heart Association, 2012 

Na ausência de uma via aérea avançada, o indicado será a realização de 30 compressões para cada 2 ventilações. Porém, após o estabelecimento dessa via aérea avançada, as compressões deverão ser feitas continuamente e simultaneamente às ventilações, que serão feitas a cada 6 segundos.

Abrir as vias aéreas

A abertura das vias aéreas para uma adequada ventilação poderá ser feita mediante duas manobras: 

  • Jaw Thrust: elevação da mandíbula, proporcionando uma abertura da via aérea mantendo a cervical estável em posição neutra (ideal para casos em que houve possibilidade de trauma) 
  • Head tilt-chin lift: elevação do queixo e extensão da cabeça (para quando não houver história de trauma) 
Imagens mostrando as manobras de abertura de via aérea
Manobras de abertura de via aérea. Fonte: Medic tests
Desfibrilação precoce 

Em um ambiente pré-hospitalar, tendo em mãos o DEA, o próprio aparelho irá nos indicar se o paciente apresenta ou não um ritmo chocável. Já nos ambientes intra-hospitalares, poderão ser utilizados desfibriladores manuais ou semiautomáticos monofásicos ou bifásicos. Para pacientes em posição supina, a posição das pás deverá ser anteroapical: uma pá é colocada em ápice cardíaco e a outra pá em região infraclavicular direita. 

Nos casos dos desfibriladores manuais, você deve reconhecer os ritmos de parada e identificar se o paciente tem um ritmo chocável ou não. No caso dos ritmos chocáveis, o médico deve selecionar a carga, sendo recomendada na PCR 360 J em aparelhos monofásicos e 120-200 J nos bifásicos. 

ATENÇÃO! A American Heart Association (AHA) é contrária ao uso de soco precordial de rotina em pacientes em PCR. 

Suporte Avançado de Vida 

Como foi dito, no suporte avançado de vida, poderemos fazer uso de dispositivos de via aérea avançada, acessos venosos com infusão de medicamentos e parâmetros de monitorização. 

Algoritmo de PCR em adultos em ambiente intra-hospitalar
Algoritmo de PCR em adultos em ambiente intra-hospitalar. Fonte: AHA, 2020

Note que, nos ritmos chocáveis, a epinefrina é empregada apenas após o segundo choque, enquanto que a amiodarona passa a ser administrada depois do terceiro choque, podendo ser repetida em 3-5 minutos, porém em uma dosagem menor (dosagem no algoritmo). Além disso, a epinefrina pode ser substituída pela vasopressina, enquanto que a amiodarona, pela lidocaína. 

Conclusão

A Parada Cardiorrespiratória (PCR) é um evento crítico que exige conhecimento e rapidez no atendimento. Nos ambientes extra-hospitalares, o socorrista deverá seguir o protocolo do Suporte Básico de Vida (SBV). O SBV abrange uma série de passos essenciais, incluindo compressões torácicas, abertura de vias aéreas e desfibrilação precoce, fundamentais para aumentar as chances de sobrevivência. 

Em um contexto intra-hospitalar, deve ser seguido o Suporte Avançado de Vida (SAV), o qual permite a utilização de dispositivos avançados e medicamentos, seguindo protocolos específicos. A eficácia no manejo da PCR depende do conhecimento e aplicação correta dos protocolos por todos os envolvidos.

Continue aprendendo:

FONTES:

  • TSAO, Connie W. et al. Heart disease and stroke statistics—2023 update: a report from the American Heart Association. Circulation, v. 147, n. 8, p. e93-e621, 2023.
  • Diretrizes RCP e  ACE American Heart Association, 2020
  • DynaMed. Adult Basic Life Support (BLS). EBSCO Information Services. Accessed 13 de junho de 2024
  • PANCHAL, Ashish R. et al. Part 3: adult basic and advanced life support: 2020 American Heart Association guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiovascular care. Circulation, v. 142, n. 16_Suppl_2, p. S366-S468, 2020.

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