A síndrome de Rett foi descrita pela primeira vez por Andreas Rett, em 1966. É considerada uma das principais causas de deficiência mental severa em crianças, acometendo quase exclusivamente o sexo feminino. É uma doença ainda sem cura, entretanto, a descoberta do principal gene acometido na doença permitiu a pesquisa de novos possíveis tratamentos.
O que é a síndrome de Rett?
A síndrome de Rett é uma doença genética caracterizada por uma deterioração do neurodesenvolvimento, possuindo associação com a hiperamonemia. Para mais, tem uma prevalência estimada de 1:10.000 a 1:15.000 crianças, sendo considerada uma doença rara.
Etiologia
Cerca de 97% dos pacientes com a forma clássica e 75% com formas atípicas tem uma mutação no gene MECP2, localizado no cromossomo Xq28. A proteína produzida por esse gene (MeCP2) atua como um repressor global de transcrição genética, e possui diversas funções, entre elas, a supressão de genes inflamatórios que promovem neuroinflamação e disfunção neuronal.
Além disso, a perda da função do MECP2 promove ativação da via P53, promovendo a senescência neuronal e acometendo a ramificação dendrítica e, dessa forma, estimulando a neurodegeneração. Para mais, a desaceleração no crescimento do parênquima encefálico é mais evidente no lobo frontal, núcleo caudado e mesencéfalo.
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Sintomas da síndrome de Rett
A doença evolui de forma previsível e em estágios. Nos primeiros meses de vida, é comum a afirmativa de que a criança apresenta desenvolvimento normal. Entretanto, sabe-se que é frequente o surgimento da hipotonia muscular e da dificuldade de engatinhar como primeiros sintomas da doença.
Assim, o primeiro estágio da doença consiste na “estagnação precoce”, tendo início entre os primeiros 6 a 18 meses de vida da criança. É caracterizada pela parada no desenvolvimento, desaceleração no aumento do perímetro encefálico, redução da interação social e isolamento, tendo duração de alguns meses.
Posteriormente, o segundo estágio é denominado “rapidamente destrutivo”, com início entre o 1º e o 3º ano de vida, e duração de semanas a meses. Nessa fase, ocorre uma rápida regressão psicomotora, e a criança apresenta choro e irritabilidade extrema, bem como a perda da fala.
Para mais, surgem movimentos estereotipados nas mãos, bem como há perda da função práxica (capacidade de planejar e executar movimentos complexos e coordenados). E ainda, ocorrem disfunções respiratórias, com o surgimento de apneia em vigília e episódios de hiperventilação, por exemplo; e distúrbios do sono.
Entre os 2 e 10 anos da vida da criança, ocorre o terceiro estágio, denominado “pseudo-estacionário”. Nele, há uma melhora dos sintomas e da capacidade de interação social. Entretanto, são evidentes os sintomas motores: ataxia, apraxia, espasticidade, escoliose e bruxismo.
Por fim, o quarto estágio é denominado “deterioração motora tardia”, e consiste em uma lenta progressão dos déficits motores (evoluindo para a necessidade de cadeira de rodas), da escoliose, é uma deficiência mental severa. Para mais, a presença de coreoatetose é comum nessa fase.
O surgimento de crises epilépticas é comum na síndrome de Rett (60%), com 50% desses pacientes apresentando a forma generalizada, e epilepsias focais em 50% dos casos. O quadro é frequentemente resistente ao tratamento, entretanto, a partir do estágio IV, comumente é observada uma melhora nas crises. Além disso, 10% das pacientes podem apresentar alargamento do intervalo QT no eletrocardiograma.
Para mais, as manifestações gastrointestinais são muito frequentes, acometendo 92% desses pacientes. São sintomas frequentes o refluxo gastroesofágico, vômitos, asfixia e náuseas após a alimentação. Assim, distúrbios nutricionais, que variam do baixo peso ao sobrepeso são comuns nessa população, bem como anomalias esqueléticas devido a baixa mineralização óssea (37%).
Diagnóstico da síndrome de Rett
O diagnóstico da síndrome de Rett se baseia na presença dos critérios clínicos compatíveis (observe a tabela abaixo). Entretanto, com a descoberta do gene MECP2, acredita-se que futuramente o estudo genético seja uma possibilidade para auxiliar no diagnóstico.
Eletroencefalograma na síndrome de Rett
O eletroencefalograma (EEG) na síndrome de Rett é, em geral, muito alterado. Com a progressão das fases I a III, observa-se uma lentificação do ritmo de base e o surgimento de ondas pontiagudas que são projetadas, em geral, nas regiões centrolobulares. A partir do estágio IV, podem ser observados uma melhora no traçado, com diminuição dos elementos epileptiformes.
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Qual o tratamento?
Anteriormente, o manejo da síndrome de Rett consistia no tratamento exclusivamente sintomático. Entretanto, em 2023, foi aprovada pela Anvisa uma medicação para meninas com idade > 2 anos e adultos: a trofinetide, um análogo do fator de crescimento similar à insulina-1 (IGF-1).
O IGF-1 tem efeitos similares ao fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF), essencial para a diferenciação, sobrevivência e neuro plasticidade neuronal. Entretanto, o BDNF não penetra tão facilmente na barreira hematoencefálica, diferentemente do IGF-1. Para mais, a trofinetide tem como importante efeito colateral a diarreia, que pode ser de difícil manejo.
Conclusão
A síndrome de Rett é uma doença genética complexa e rara que, embora ainda não tenha cura, tem recebido crescente atenção na comunidade científica devido aos avanços no entendimento de sua etiologia e fisiopatologia. A abordagem multidisciplinar permanece essencial, envolvendo diversos especialistas para oferecer cuidado integral e individualizado aos pacientes e suas famílias.
Continue aprendendo:
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FONTES:
- SCHWARTZMAN, J. S.. Síndrome de Rett. Brazilian Journal of Psychiatry, v. 25, n. 2, p. 110–113, jun. 2003.
- CABAL-HERRERA, A. M., BEATTY, C. W.. Síndrome de Rett: desde la fisiopatología a las novedades en el tratamiento. Medicina (B Aires), v. 3, p. 45-49, set. 2024.
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