Clínica Médica
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Ascite: fisiopatologia, causas, quadro clínico e tratamento

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Equipe medclub
Publicado em
20/3/2024
 · 
Atualizado em
20/3/2024
Índice

Em meio a um crescimento constante do mercado alcoólico e a persistência de grandes estigmas na busca pela assistência médica, ainda há uma significativa prevalência de pacientes alcoólatras evoluindo para fígados cirróticos e, consequentemente, para uma ascite de rápido crescimento. Dessa forma, é importante discutirmos sobre ascite e entender suas diversas etiologias.

O que é ascite?

Ascite é uma condição clínica caracterizada pelo acúmulo de líquido no abdome, ou seja, na cavidade peritoneal, de forma que fique com livre mobilidade e em contato direto com as lâminas peritoneais e próximo às vísceras. Os componentes do líquido variam de acordo com a sua etiologia, mas também se há infecção presente por desenvolvimento bacteriano, a exemplo da Peritonite Bacteriana Espontânea (PBE).

Ilustração representativa da cavidade peritoneal entre as vísceras abdominais com o acúmulo de líquido ascítico
Ilustração representativa da cavidade peritoneal entre as vísceras abdominais com o acúmulo de líquido ascítico. Fonte: Health Jade

Quais as suas etiologias?

Como já mencionado, a cirrose é a principal etiologia da ascite, sendo responsável por cerca de 82% dos seus casos. Contudo, vale a pena destacar a grande diversidade de causas para o seu desenvolvimento, principalmente para aquelas que causam alterações hemodinâmicas com aumento da pressão venosa portal ou desregulação proteica intravascular, como insuficiência hepática aguda e desnutrição severa. Aqui estão as principais etiologias e sua prevalência:

Causas Prevalência
Cirrose 81%
Câncer 10%
Insuficiência Cardíaca 3%
Tuberculose 2%
Diálise 1%
Doença Pancreática 1%
Outros 2%
Fonte: Evaluation of adults with ascites - UpToDate

Como funciona a sua fisiopatologia da ascite?

Considerando sua multicausalidade, a vias fisiopatológicas para a formação da ascite variam de acordo com a sua etiologia. Entretanto, sabe-se que devido ao intenso fluxo sanguíneo presente na circulação portal, quaisquer alterações hemodinâmicas que reduzem a velocidade de fluxo com consequente aumento de pressão hidrostática, resulta em uma hipertensão portal com saída de líquido para a cavidade peritoneal. 

Além disso, tendo em vista a importância do equilíbrio entre pressões intravasculares (hidrostática x coloidosmótica), contextos de hipoalbuminemia, como a desnutrição severa, podem resultar em líquido ascítico. Ademais, doenças peritoneais com processo inflamatório local também resultam em edema e consequente ascite.

Ilustração mostrando o modo de atuação da pressão hidrostática e coloidosmótica no leito vascular
Observe o modo de atuação da pressão hidrostática e coloidosmótica no leito vascular para formação de líquido no compartimento extracelular. Fonte: Robbins, Patologia Básica

Quais as manifestações mais comuns?

O quadro clínico da ascite varia de acordo com seu grau de gravidade, de modo que em contextos mais brandos a maioria dos pacientes pode ser assintomático. Porém, quando o grau vai de moderado a grave, sintomatologia como dispneia (fôlego curto), ortopneia, distensão abdominal e dor abdominal podem surgir em associação com as manifestações de sua patologia de base. 

Como deve ser realizado o diagnóstico?

Apesar dos diferentes níveis de gravidade, o uso do exame físico + ultrassonografia é considerado como o método diagnóstico padrão-ouro. Isto porque através da inspeção e percussão abdominal é possível identificar uma distensão anormal do abdômen, além da presença de som maciço que se modifica de local de acordo com as diferentes posições adotadas pelo paciente em decúbito (macicez móvel)

Porém, a ultrassonografia pode ser o único método diagnóstico em graus mais leves. Segue os graus de severidade adotados pelo Clube Internacional de Ascite:

  • Grau 1: Ascite leve. Detectada apenas com ultrassonografia
  • Grau 2: Ascite moderada. Presença de distensão abdominal assimétrica
  • Grau 3: Ascite grave/extensa. Presença de distensão+tensão abdominal significativa.

Como fazer a avaliação do líquido ascítico?

Uma vez confirmada a presença da condição clínica, é de extrema importância a caracterização dos componentes desse líquido para auxiliar na busca diagnóstica de sua etiologia. Dessa forma, a paracentese é o procedimento de escolha, pois permite a coleta de uma pequena quantidade do líquido para sua avaliação instantânea pela inspeção.

Ademais, é feita a avaliação laboratorial de alguns parâmetros principais, como contagem de células totais e seu diferencial (principalmente leucócitos/polimorfonucleares), contagem de albumina e de proteínas totais. Somada a isso, a contagem do gradiente de albumina sérica-ascítica (SAAG) permite identificar uma ascite originada por hipertensão portal (SAAG > ou igual 1.1).

Tratamento para ascite

Para melhor opção terapêutica é necessário sua classificação de acordo com o grau de intensidade previamente descrito. Isso porque, em pacientes com ascite Grau 1 ou 2, a redução do volume de líquido ascítico pode ser feita com restrição de ingesta de sódio (2g/dia) + diuréticos (DIU), sendo os grupos de poupadores de potássio (espironolactona) ou de alça (furosemida), os mais utilizados. Contudo, é de extrema importância o manejo de seu fator causal para um controle efetivamente terapêutico, sendo esse individualizado após o diagnóstico etiológico específico.

A partir do momento que o volume for estabilizado em níveis mínimos, os diuréticos devem ser reduzidos à sua dosagem mínima para evitar efeitos adversos. Em casos de Grau 3, a paracentese terapêutica é a 1° linha, seguido por diuréticos + restrição de sódio. Seguem as dosagens recomendadas dos DIU:

  • Espironolactona: 100-400 mg/dia
  • Furosemida: 40-160 mg/dia

Como realizar o manejo farmacológico?

Como já mencionado, os diuréticos são os maiores aliados para tratamento da ascite e devem ser iniciados em sua dose mínima com escalonamento até dosagem máxima de acordo com necessidade de controle da condição clínica. 

Em situações de 1° episódio de ascite, a monoterapia com espironolactona é recomendada; enquanto que em ascite de longa duração/refratárias, à terapia combinada (espironolactona+furosemida) é a melhor opção. Deve-se ficar muito atento aos seus efeitos adversos como ginecomastia dolorosa e cãibras, uma vez que são sinais de hiponatremia (Na < 125mmol/L).

Conclusão

Apesar de seu quadro oligossintomático e, por vezes, assintomático, a ascite deve ser prontamente diagnosticada e tratada uma vez que há risco de evolução para PBE, a qual aumenta significativamente a sua mortalidade. Diante disso, é de extrema importância o seu conhecimento para diagnóstico e manejo a fim de garantir sobrevida aos pacientes.

Continue aprendendo:

FONTES:

  • Evaluation of adults with ascites - UpToDate
  • Diagnosis, Evaluation and Management of Ascites, Spontaneous Bacterial Peritonitis and Hepatorenal Syndrome: 2021 Practice Guidance by the American Association for the Study of Liver Diseases
  • Robbins, Patologia Básica
  • Ascite - MSD Manuals

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