O derrame pleural é o acúmulo anormal de líquido no espaço pleural. Ele ocorre devido a diversas etiologias, e pode causar intenso desconforto no paciente. Neste texto, será discorrido a importância da diferenciação entre transudato e exsudato, bem como a técnica para realizar toracocentese, e como interpretar a análise bioquímica do líquido pleural.
Fisiologia
O espaço pleural está localizado entre os pulmões e a parede torácica, e entre as pleuras visceral e parietal há uma camada muito fina de líquido. Esse líquido adentra o espaço pleural através de finos capilares que perpassam a pleural parietal, e é continuamente drenado pelos canais linfáticos, também localizados na pleural parietal.
Entretanto, o líquido também pode adentrar o espaço pleural a partir do espaço intersticial pulmonar, bem como através da cavidade peritoneal, a partir de pequenos orifícios existentes no diafragma que permite sua passagem. Todavia, os canais linfáticos absorvem o líquido 20 vezes mais rápido do que este é produzido.
Portanto, o derrame pleural ocorre quando há uma produção excessiva de líquido pleural, através dos espaços pulmonares, da pleural parietal ou da cavidade peritoneal, ou quando há uma redução na velocidade de remoção do líquido pelos vasos linfáticos localizados na pleural parietal.
Quais são as causas de derrame pleural?
O derrame pleural pode ser classificado em exsudato e transudato. O transudato é formado devido a alterações sistêmicas que comprometem o balanço de produção e absorção do líquido, e tem como principais causas a insuficiência ventricular esquerda e a cirrose.
Já o derrame pleural exsudativo pode surgir devido a pneumonias bacterianas, neoplasias malignas, infecções virais e embolias pulmonares. E mais, o tromboembolismo pulmonar (TEP), doenças autoimunes e o quilotórax. Observe a tabela abaixo com as principais causas.
Sinais e sintomas de derrame pleural
Os principais sinais e sintomas do derrame pleural são a dor torácica tipo pleurítica, sendo caracterizada pela piora da dor com a inspiração. Além disso, são sintomas comuns a dispneia, que pode estar presente a depender da extensão do derrame pleural e da reserva cardiopulmonar do paciente e a tosse, que comumente é seca.
Por fim, a trepopneia, que é definida pela preferência do indivíduo em deitar-se para o lado do pulmão acometido pelo derrame - a fim de facilitar a respiração pelo pulmão saudável - também pode estar presente.
Ao exame físico, pode ser possível observar diminuição ou abolição do murmúrio vesicular, redução do frêmito toracovocal e egofonia. Sendo esse sintoma caracterizado pela presença de som mais abafado à ausculta no local acometido. E mais, pode haver macicez à percussão, abaulamento do hemitórax e desvio do ictus e da traqueia.
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Diagnóstico e tratamento do derrame pleural
Todo paciente com suspeita de derrame pleural deve ser submetido a um exame de imagem do tórax para diagnosticar a sua extensão. A ultrassonografia (USG) é um exame melhor que a radiografia de tórax em decúbito lateral (incidência de Lawrell) para avaliação da suspeita do problema, e muito útil como guia para a toracocentese.
Na incidência de Lawrell, o paciente é posicionado em decúbito lateral no hemitórax acometido, sendo essa a incidência mais sensível para visualizar o derrame. Nesse caso, observa-se a lâmina de líquido formar uma linha no hemitórax, e se ela apresentar pelo menos 10mm (1cm), há pelo menos 200 a 300 mL de líquido no espaço pleural, a toracocentese diagnóstica está autorizada.
Para mais, na incidência em PA, observa-se presença de obliteração do seio costofrênico, que ocorre quando há presença de 175 a 200mL de líquido no espaço pleural. Em derrames pleurais mais extensos, pode ser possível observar a parábola de Damoiseau.
Já na incidência em perfil, há maior sensibilidade para detecção, permitindo visualizar derrames de 75 a 100mL. Nessa incidência, observa-se obliteração do seio costofrênico posterior. Por fim, após a descoberta do problema, deve-se avaliar sua causa.
Assim, o primeiro passo é avaliar se o líquido pleural é um transudato ou exsudato. Isso porque a diferenciação entre ambos os tipos de líquido são fundamentais para indicação de exames adicionais, a fim de definir sua etiologia. Dessa forma, torna-se fundamental a realização da toracocentese.
Como realizar a toracocentese?
A toracocentese é um exame importante para esclarecer a etiologia. Assim, está indicada em pacientes com derrame pleural novo e sem causa aparente. Entretanto, é contraindicada quando houver quantidade de líquido insuficiente para realizar a coleta e em sítios de infecção de pele e em casos de diátese hemorrágica.
Além disso, a toracocentese pode ser diagnóstica ou terapêutica, ou ambas. E mais, pode ser realizada em caráter eletivo ou de urgência, como por exemplo por causa de um pneumotórax hipertensivo. Observe a tabela abaixo com os equipamentos necessários para a realização desse procedimento.
O procedimento pode ser realizado em centro cirúrgico ou à beira leito. O paciente deve estar sentado sobre a superfície, com os braços apoiados sobre uma mesa. Objetiva-se que a punção seja realizada abaixo da escápula, ao nível do 10º espaço intercostal.
Entretanto, em pacientes impossibilitados de sentar-se, ele pode ser realizado em decúbito dorsal e com a cabeceira elevada, ao nível do 7º espaço intercostal, entre a linha axilar média e posterior. A anestesia deve ser feita com lidocaína a 2%, sem vasoconstritor.
Para mais, devido ao feixe neurovascular (nervo, artérias e veias intercostais) estarem situados na borda inferior das costelas, a punção da toracocentese deve ser feita na borda superior da costela inferior. A agulha deve ser introduzida sob pressão negativa, até que seja aspirado o líquido da cavidade pleural.
Após a saída do líquido pleural, deve-se introduzir a agulha Intracath e, posteriormente, o cateter, que deve ser fenestrado para facilitar a drenagem. Após a coleta do líquido para análise, pode-se conectar o equipo ao Intracath, e esse ao frasco a vácuo, permitindo que o líquido seja drenado pela gravidade. Assista ao vídeo abaixo.
Por fim, não existe volume máximo de líquido pleural a ser drenado. Entretanto, em drenagens de grande volume, recomenda-se a retirada do líquido de forma lenta, com objetivo de prevenir o surgimento de edema de reexpansão pulmonar.
As complicações mais frequentes são a dor torácica progressiva à saída do líquido, tosse intensa e dispneia. Além disso, o paciente pode apresentar náuseas e tontura, devido a ativação do reflexo vasovagal. Esses sintomas podem ser revertidos com a retirada gradual do líquido da pleural ou com a colocação de cateter de O2 nasal.
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Análise do líquido pleural
A análise laboratorial do líquido pleural consiste na avaliação da bioquímica, diferencial citológico e citologia oncótica. E mais, na identificação do pH, dos níveis de adenosina deaminase (ADA) e da cultura geral e coloração Gram. Também é feita uma pesquisa e cultura para BAAR (bacilo álcool-ácido resistente), fungos e antibiograma.
Entretanto, inicialmente, realiza-se a análise macroscópica do líquido. A presença de odor fétido aumenta as suspeitas de bactérias anaeróbicas. Além disso, a coloração do líquido também oferece informações importantes. Caso esse seja sero-fibrinoso, aumenta-se as suspeitas de um conteúdo celular ou lipídico.
Para mais, caso seja sero-hemático ou hemático, há maiores propensões para um derrame pleural devido a um tromboembolismo pulmonar (TEP), câncer ou traumas. E ainda, caso apresente aspecto purulento, corresponde a um empiema e, se apresenta aspecto leitoso, tem característica de um quilotórax. Por fim, a coloração seroso/citrino representa um achado inespecífico.
Análise bioquímica
A análise bioquímica é o primeiro passo na avaliação do líquido pleural, pois permite a diferenciação entre transudato e exsudato. Essa distinção é fundamental porque a presença de transudato indica que a pleural está normal, e que está ocorrendo um desequilíbrio entre as pressões hidrostática e oncótica. Já a presença de exsudato indica que a pleural está sendo diretamente afetada.
Para fazer essa diferenciação, utilizam-se os critérios de Light, dispostos abaixo:
- Proteínas totais do líquido pleural/sangue > 0,5
- DHL pleural/sangue > 0,6
- DHL pleural > 2/3 do limite superior normal do DHL sérico
Caso o indivíduo não preencha nenhum desses critérios, o problema é considerado do tipo transudato. Entretanto, se apresenta ao menos um desses critérios, o líquido pleural é considerado um exsudato. Todavia, entre 15% e 25% dos derrames pleurais exsudativos são erroneamente classificados como transudatos, sendo essa situação comum na insuficiência cardíaca.
Nesses casos, é possível realizar o gradiente soro-pleural de proteínas, que deve ser > 3,1 g/dL, ou o gradiente soro-pleural de albumina, que deve ser > 1,2 g/dL. Assim, nos casos transudativos, realiza-se o tratamento da doença de base. Entretanto, nos casos exsudativos, deve-se prosseguir com a investigação etiológica.
Ainda sobre a análise bioquímica, derrames pleurais com glicose baixa (< 60 mg/dL) e pH baixo (<7,3) indicam provável presença de neutrófilos, visto que esses atuam consumindo a glicose do líquido pleural e produzindo ácido lático, devido ao seu metabolismo anaeróbico.
Esses achados são comuns em derrames parapneumônicos complicados e em empiemas, bem como no derrame maligno e na tuberculose (TB) pleural. E mais, também pode estar presente em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES), na ruptura esofágica e na artrite reumatóide (AR).
A presença de amilase elevada (> 200/L) pode estar presente em pacientes com comprometimento pancreático (pancreatite, câncer de pâncreas ou cisto hepático), ruptura esofágica ou câncer de pulmão. E mais, a ADA > 40 a 60 U/L é muito útil no diagnóstico de tuberculose e, quando associada ao predomínio de linfomononucleares, aumenta ainda mais as suspeitas.
Celularidade e hematócrito
O hematócrito pleural/sérico > 0,5 define a presença de hemotórax. E mais, a depender do predomínio celular, pode-se direcionar o raciocínio diagnóstico para determinada etiologia. Observe a tabela abaixo com as principais condições associadas ao tipo celular presente.
Conclusão
O derrame pleural é uma condição muito comum, e o médico generalista irá inevitavelmente deparar-se com um durante sua formação médica, nas enfermarias e nos departamentos de emergência. Por isso, faz-se necessário o conhecimento de como realizar uma toracocentese, bem como identificar os principais achados que podem ser evidenciados na análise bioquímica do líquido pleural.
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FONTES:
- AMATO, A. C. K. Procedimentos médicos: técnica e tática. 2ª ed. Rio de Janeiro: Roca, 216
- FAUCI, Jameson. et al. Medicina Interna de Harrison. Porto Alegre: AMGH, 2020
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