A esofagite eosinofílica (EoE) é uma doença de bastante relevância clínica, por causar bastante impacto na saúde digestiva e na qualidade de vida dos pacientes. Conhecer bem essa patologia é de suma importância e chegar no seu diagnóstico pode ser desafiador. Neste artigo, abordaremos os principais sintomas, como diagnosticá-la e como tratá-la.
O que é esofagite eosinofílica?
A esofagite eosinofílica é definida como uma doença esofágica crônica, imunomediada/mediada por antígenos, clinicamente caracterizada por sintomas relacionados à disfunção esofágica e histologicamente por inflamação de predomínio eosinofílica.
A doença pode ser classificada em 3 subtipos patogenicamente distintos:
- EoEe1: subtipo mais leve, com esôfago de aparência normal e alterações histológicas, endoscópicas e moleculares leves.
- EoEe2: Subtipo que apresenta maior expressão de citocinas inflamatórias, como IL-4, IL-5 e IL-13. É fortemente associada a alergias alimentares e ambientais.
- EoEe3: marcado por um maior grau de gravidade endoscópica e histológica e pela menor expressão de genes de diferenciação epitelial. O endótipo é fibroestenótico associado a um esôfago de calibre estreito.
O efeito dessa inflamação causa danos ao esôfago ao longo do tempo, dificultando a deglutição do alimento cada vez mais.
Etiologia
Apesar de ainda não ser totalmente compreendida, sabe-se que o surgimento da esofagite eosinofílica é causada por fatores genéticos, ambientais e do sistema imunológico do hospedeiro.
Ao contrário do que se pensava, a EoE não é causada por um defeito eosinofílico, mas sim por um defeito primário na função epitelial esofágica. Análises moleculares elucidaram que o esôfago de pacientes com EoE tem um comprometimento da diferenciação das células epiteliais e da função de barreira.
Proteínas antigênicas, derivadas de alimentos e de proteínas inaladas (menos comum) desencadeiam uma resposta mediada por células T auxiliares adaptativas tipo 2 (Th2), que produzem citocinas, principalmente as interleucinas (IL) 5 e 13. Essas interleucinas acabam induzindo a ativação de eosinófilos e a diminuição da expressão de genes envolvidos na função de barreira.
O esôfago é normalmente desprovido de eosinófilos, e quando ocorrem achados de eosinófilos esofágicos, já podemos pensar em uma patologia, geralmente ou EoE ou doença do refluxo gastroesofágico.
A resposta imune gerada por antígenos ambientais se relaciona com possível predisposição genética, uma vez que estudos evidenciaram que a grande maioria de pacientes possuem uma sensibilização a alérgenos alimentares e aeroalérgenos. Essa predisposição genética está relacionada com defeitos genéticos, especialmente em 2p23.
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Sintomas de esofagite eosinofílica
Os sintomas mais comuns da esofagite eosinofílica são:
- Disfagia
- Impactação alimentar
- Dor no peito, geralmente localizada centralmente, geralmente refratária ao uso de antiácidos
- Sintomas parecidos com a doença de refluxo gastroesofágico ou azia refratária
- Dor abdominal superior
Desses sintomas, podemos dizer que o principal sintoma é a disfagia para alimentos sólidos, e é por isso que pacientes que chegam com queixas de disfagia devem sempre ser avaliados quanto a possibilidade de terem esse tipo de esofagite.
Além disso, sintomas como impactação alimentar foram vistos em até 54% dos pacientes, enquanto que estenoses esofágicas, em até 31%. Quando a dismotilidade esofágica ocorre, podemos prever um possível envolvimento eosinofílico nas camadas musculares do esôfago.
Vale lembrar que existe uma forte associação da esofagite eosinofílica com condições alérgicas, como as alergias alimentares, ambientais, asma e dermatite atópica.
Diagnóstico de esofagite eosinofílica
A suspeita clínica se dá mediante a presença das manifestações clínicas compatíveis com a doença. Somado a isso, é importante também na anamnese questionar sobre a presença de comorbidades atópicas, como asma, rinite alérgica, alergias alimentares, de histórico familiar de EoE e de antecedentes pessoais de perfuração esofágica ou dor intensa após dilatação de uma estenose.
O diagnóstico, por sua vez, é feito através da utilização de endoscopia alta com biópsias esofágicas, além da exclusão de outros distúrbios que também causam eosinofilia esofágica.
Como os sintomas não são específicos, muitas vezes não é possível estabelecer um diagnóstico. Por isso, para facilitar o diagnóstico e possibilitar um tratamento mais precoce possível, o profissional pode se apoiar nos seguintes critérios, em que todos devem estar presentes:
- Sintomas relacionados à disfunção esofágica;
- Inflamação predominantemente eosinófila na biópsia esofágica, com valor de pico ≥ 15 eosinófilos por campo de alta potência (ou 60 eosinófilos por mm2);
- Exclusão de outras causas que possuem sintomas semelhantes à eosinofilia esofágica.
Dentre os possíveis achados da endoscopia alta estão: anéis circulares empilhados, estenoses, atenuação do padrão vascular subepitelial, sulcos lineares, manchas esbranquiçadas e esôfago de pequeno calibre.
Porém, a aparência endoscópica por si só tem utilidade limitada no diagnóstico de esofagite eosinofílica, uma vez que a endoscopia deve ser feita com biópsia para a avaliação histológica. Nessa biópsia, deverá ser visto um número aumentado de eosinófilos. Ademais, outros achados histológicos também são sugestivos, como microabscessos eosinofílicos, camada superficial de eosinofílicos, grânulos de eosinófilos extracelulares, fibrose e inflamação subepitelial, aumento no número de mastócitos e células portadores de IgE.
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Tratamento para esofagite eosinofílica
O Tratamento inclui intervenções dietéticas, farmacológicas e endoscópicas. Veja a seguir.
Terapia Dietética
Como foi visto que os pacientes têm altas taxas de alergias alimentares, é indicado dietas de eliminação de alérgenos e elementares, uma vez que as alergias podem contribuir para o desenvolvimento do quadro de esofagite.
Assim, sugere-se evitar alérgenos alimentares conhecidos para os pacientes em que as alergias específicas podem ser identificadas.
Terapia farmacológica
A supressão de ácido por meio dos inibidores da bomba de prótons está entre as opções de tratamento de primeira linha.
Para pacientes tratados com Inibidores da Bomba de Prótons (IBP), o tratamento inicial deve ser feito por 8 semanas, de dose completa uma vez ao dia ou, se os sintomas não melhorarem após 4 semanas, passar a fazer uma dosagem de duas vezes ao dia. Após isso, é feito uma endoscopia alta para avaliar se houve melhora endoscópica e histológica.
Para os pacientes que respondem ao tratamento com IBP, é indicado continuar o uso do fármaco em doses menores, mas para os pacientes com sintomas persistentes e/ou com eosinofilia esofágica, outras alternativas podem ser buscadas, como o uso de glicocorticoides tópicos.
Para esses pacientes que farão uso de glicocorticoide tópico, sugere-se o uso de suspensão oral de budesonida, ou fluticasona se a budesonida não estiver disponível. A dose recomendada para pacientes acima de 11 anos para suspensão oral de budesonida é de 2 mg, duas vezes ao dia por 12 semanas.
Para as terapias de manutenção, recomenda-se o uso de glicocorticoides tópicos e/ou restrição alimentar para todos os pacientes, principalmente aqueles com disfagia grave ou impactação alimentar, estenose de alto grau ou recidiva sintomática ou histológica de forma rápida após a administração da terapia inicial.
Dilatação esofágica
Aqueles pacientes que apresentarem anéis ou estenoses esofágicas poderão necessitar de dilatação esofágica, procedimento associado com acontecimento de rupturas da mucosa e perfuração esofágica e, por isso, precisa ser realizado com cautela.
Por isso, deve-se evitar a dilatação até que o paciente tenha feito tratamento com glicocorticoide tópico, pois pode aliviar a disfagia e evitar a necessidade de dilatação.
Conclusão
A esofagite eosinofílica (EoE) é uma condição crônica de origem imunológica que impacta significativamente a função esofágica, causando sintomas como disfagia, dor torácica e impactação alimentar. O diagnóstico pode ser bastante desafiador, exigindo a identificação de inflamação eosinofílica na biópsia esofágica, acompanhada da exclusão de outras causas. O tratamento envolve uma abordagem multifacetada, incluindo modificações dietéticas, uso de inibidores da bomba de prótons (IBP) e glicocorticoides tópicos, além da possível necessidade de dilatação esofágica em casos de estenoses.
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FONTES:
- Dellon ES, Rothenberg ME, Collins MH, et al: Dupilumab in Adults and Adolescents with Eosinophilic Esophagitis. N Engl J Med 387(25):2317-2330, 2022. doi: 10.1056/NEJMoa2205982
- Mayerhofer C, Kavallar AM, Aldrian D, et al: Efficacy of Elimination Diets in Eosinophilic Esophagitis: A Systematic Review and Meta-analysis. Clin Gastroenterol Hepatol 21(9):2197-2210.e3, 2023. doi: 10.1016/j.cgh.2023.01.019
- BONIS, P. A. L., GUPTA, S. K. Clinical manifestations and diagnosis of eosinophilic esophagitis (EoE). UpToDate. 2024
- Gastroenterologia Tratado de Gastroenterologia - Da Graduação à Pós-graduação, Schilioma Zaterka, Jayme Natan Eisig, eds. 2ª ed., São Paulo: Editora Atheneu, 2016
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