A hiponatremia é um distúrbio hidroeletrolítico comum, e pode provocar sérias consequências neurológicas no indivíduo. Por isso, seu rápido reconhecimento e identificação etiológica são fundamentais para o manejo adequado no paciente que, por vezes, pode necessitar de reposição deste eletrólito.
O que é Hiponatremia?
Os valores séricos do sódio (Na) considerados normais estão entre 135 e 145 mEq/L, portanto, a hiponatremia é definida como Na < 135 mEq/L. Para mais, pode ser classificada da seguinte maneira:
- Leve: Na ≥ 130 e ≤ 134 mEq/L;
- Moderada: Na ≥ 120 e ≤ 129 mEq/L; e
- Severa: Na < 120 mEq/L.
Para mais, a maioria dos distúrbios do sódio estão relacionados com a água. Por isso, é essencial relembrar o conceito de osmolaridade, que é definido pela relação da quantidade de soluto existente dentro de um solvente, e suas propriedades coligativas, ou seja, pela capacidade de um meio de “atrair água”.
Dessa forma, a capacidade de “atrair água” de um meio está diretamente interligada com a quantidade de solutos dentro de um solvente: quanto mais partículas, maior a capacidade de um meio de atrair água. Assim, a osmolaridade normal do plasma é de 275 a 295 mOsm/L, e o cálculo utilizado para identificar a osmolaridade do plasma está disposto abaixo:
Assim, os principais solutos que compõem a osmolaridade do plasma são o sódio e a glicose. Isso porque o potássio é um íon predominantemente intracelular, e apresenta concentrações muito baixas no plasma. Já a uréia é uma substância com capacidade de atravessar livremente a membrana plasmática das células e, por isso, sua concentração no meio extracelular é muito variável.
Principais causas da Hiponatremia
A hiponatremia pode ser classificada em hipotônica, hipertônica ou dilucional, ou em isotônica, também denominada hiponatremia pseudo-hipotônica. Para cada uma dessas situações, o raciocínio clínico para a causa deve ser direcionado a determinada etiologia. Por fim, outra importante causa - e que deve ser sempre considerada na investigação - é a síndrome da secreção inapropriada de ADH.
Hiponatremia Hipertônica
A hiperglicemia acentuada é a causa principal. Isso porque a glicose, quando em grandes quantidades no plasma altera sua osmolaridade, “puxando” a água do meio intracelular para o meio extracelular e, assim, diluindo os níveis de sódio.
Para mais, a hiponatremia hipertônica também pode ocorrer em pacientes com uso de manitol intravenoso. A droga atua provocando uma diurese osmótica e, no indivíduo com função renal comprometida, o acúmulo no plasma pode provocar o mesmo efeito observado na hiperglicemia de “retirar” água do meio intracelular para o meio extracelular e, portanto, diluir o sódio.
Além disso, a administração de imunoglobulinas intravenosas é realizada com soluções hipertônicas, que também atuam “puxando” a água do meio intra para o meio extracelular e, possivelmente, pode provocar diluição do sódio. Por fim, pacientes em pós-operatórios de ressecções transuretrais e cirurgias uterinas podem apresentar valores séricos do sódio alterado devido a lavagem vesical com soluções hipotônicas durante a cirurgia.
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Hiponatremia isotônica
Esse tipo de alteração nos valores séricos do sódio, normalmente ocorre devido a erros na análise laboratorial, sendo comuns em pacientes com hipertrigliceridemia, icterícia obstrutiva e hiperproteinemia (ex.: gamopatias). Isso porque é possível que haja uma variação na fração de água do plasma durante a análise laboratorial, reduzindo erroneamente a concentração do sódio.
Hiponatremia hipotônica
Já a hiponatremia hipotônica é a situação mais comum de hiponatremia, e pode ser classificada em hipovolêmica, hipervolêmica ou euvolêmica. Entretanto, por diversas vezes, decorre de uma situação de volemia anormal e, por isso, é parte crucial do tratamento estabelecer a euvolemia no paciente.
Hiponatremia hipotônica hipovolêmica
Nessas situações, o paciente comumente se apresenta desidratado e tendendo a hipotensão, sendo um exemplo muito comum a diarreia no idoso frágil, que pode cursar com perdas importantes de volume. Ou ainda, nos pacientes em pós-operatórios de grandes cirurgias, que sofreram grandes perdas sanguíneas.
Para mais, a hiponatremia hipotônica hipovolêmica também pode ocorrer em pacientes com quadro de obstrução intestinal, em que o líquido é deslocado para o terceiro espaço nas alças intestinais. E mais, pode acometer pessoas em quadros de hemorragias, em uso de doses elevadas de diuréticos, ou com a síndrome cerebral perdedora de sal.
Hiponatremia hipotônica hipervolêmica
A principal causa de hiponatremia hipotônica hipervolêmica é a insuficiência cardíaca, cujo exemplo clássico é o paciente que se encontra edemaciado, com crepitações na ausculta e ortopneia, por exemplo. Para além desse, aqueles com cirrose hepática e síndrome nefrótica também podem apresentar esse tipo. Nesses pacientes, há um aumento da água corporal livre, diluindo o sódio sérico.
Hiponatremia hipotônica euvolêmica
Já nesses casos, dentre as principais causas está o hipotireoidismo acentuado (ex.: mixedema) com TSH mais elevado, e a insuficiência adrenal. Esses pacientes comumente apresentam diminuição do débito cardíaco, estimulando a liberação do hormônio antidiurético (ADH) e, assim, provocando a retenção de água.
Síndrome da secreção inapropriada de ADH (SIADH)
Na SIADH, há uma liberação exacerbada de ADH. Assim, há muita retenção de água, e, portanto, tende a hipervolemia. Entretanto, o aumento do débito cardíaco causado pela hipervolemia promove a dilatação atrial, promovendo a liberação de peptídeos natriuréticos, e o paciente retorna a euvolemia, e esse ciclo se repete de forma cíclica.
Diversas situações clínicas podem provocar a SIADH, como o pós-operatório, doenças do sistema nervoso central (ex.: neoplasias, infecções, acidentes vasculares cerebrais) e doenças pulmonares, como pneumonias e câncer de pulmão, em especial nas síndromes paraneoplásicas. E mais, medicamentos psicotrópicos, ocitocinas e citotóxicos.
Quais são os sinais e sintomas da Hiponatremia?
Os sintomas da hiponatremia estão relacionados com a hiposmolaridade. Assim, quando o meio extracelular apresenta baixa osmolaridade, a tendência do líquido é “migrar” para o meio intracelular. O principal sistema prejudicado é o neurológico, uma vez que o distúrbio pode provocar edema cerebral.
Assim, são sintomas comuns as náuseas e a anorexia. E mais, a sonolência, o torpor e, até mesmo, o coma. Além disso, o paciente também pode apresentar cãibras e rabdomiólise.
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Diagnóstico
Após a identificação laboratorial, é fundamental avaliar a osmolaridade do plasma. Exemplo disso é a hiponatremia hipertônica devido a hiperglicemia, que pode provocar uma “falsa hiponatremia”. Assim, para identificar a real concentração de sódio no plasma, pode-se utilizar a seguinte fórmula:
Na (corrigido) = Na + Gli – 100 x 1.6
100
Para mais, para identificar a etiologia da hiponatremia hipotônica hipovolêmica, pode-se avaliar a concentração de sódio urinário. Quando em valores < 20 mEq/L, entende-se que os túbulos renais estão excretando menos sódio, com objetivo de concentrar esse íon no plasma. Assim, entende-se que essas perdas não são de etiologia renal.
Já em valores > 40 mEq/L, suspeita-se de perdas volêmicas por causas renais. Exemplo clássico são os pacientes em uso de diuréticos tiazídicos, que apresentam uma hipovolemia inicial e, por isso, estimulam a liberação de ADH, que promove a reabsorção da água e, portanto, dilui o sódio. Observe a tabela abaixo.
Diagnóstico da SIADH
Já para o diagnóstico da síndrome da secreção inapropriada de ADH, a osmolaridade urinária comumente é > 100 mOsm/kg, visto que é uma síndrome liberadora de ADH e, portanto, a urina deste paciente se encontra mais concentrada. Além disso, a osmolaridade sérica é < 275 mOsm/kg, devido ao estado transitório de hipervolemia.
Para mais, devido a dilatação atrial e consequente liberação de peptídeos natriuréticos, o sódio urinário é > 40 mEq/L. E mais, a nível renal, há aumento do clearence de ácido úrico, e esses indivíduos passam a apresentar concentrações < 4 mg/dL.
Principais tratamentos para a Hiponatremia
O tratamento da hiponatremia depende da sintomatologia, dos níveis séricos de sódio e da causa base do distúrbio hidroeletrolítico. Dessa forma, em pacientes assintomáticos e sem hiponatremia grave (Na > 120 mEq/L), trata-se a causa base do distúrbio.
Assim, na hiponatremia hipovolêmica, realiza-se a expansão salina com soro fisiológico a 0,9%. Já na hipervolêmica, realiza-se restrição hídrica, podendo ser prescritos diuréticos. Por fim, no paciente euvolêmico, realiza-se apenas a restrição hídrica.
Já naquele que for sintomático ou com o tipo grave (Na < 120 mEq/L), indica-se a reposição do sódio, objetivando elevar sua concentração de 8 a 12 mEq/L em 24 horas. Para realizar esse tratamento corretamente, é preciso conhecer as concentrações de sódio no líquido ao qual se deseja realizar a reposição salina. Observe abaixo:
- NaCL 0,9%: 154 mEq/L
- NaCl 3%: 513 mEq/L
- Ringer lactato: 130 mEq/L
Para mais, também é preciso conhecer a porcentagem de água corporal presente em cada indivíduo:
- Criança e homem jovem: 60%
- Homem e mulher jovem: 50%
- Mulher idosa: 45%
Ademais, a reposição do sódio deve ser feita com cautela, devido ao risco de desmielinização osmótica (mielinólise pontina).
Por fim, deve-se realizar o cálculo a partir da fórmula de reposição de sódio prediz quanto 1 litro da solução escolhida para realizar a reposição do sódio irá aumentar a natremia do paciente:
- △Na = (Na[solução] – Na[paciente])
Água Corporal + 1
Mielinólise pontina
A mielinólise pontina é uma complicação grave do tratamento para a reposição do sódio. Ocorre quando há uma correção rápida dos níveis séricos do sódio, em que o meio extracelular se torna muito hipertônico, provocando assim um deslocamento rápido da água para o meio extracelular e, portanto, provocando desidratação celular e desmielinização do tecido nervoso.
O quadro clínico comumente surge de 48 a 72 horas após a reposição do sódio, e o indivíduo pode apresentar tetraparesia espástica, disfagia e disartria, convulsões e coma. O diagnóstico deve ser feito preferencialmente com exame de imagem, preferencialmente com ressonância magnética. Entretanto, as alterações podem demorar até 4 semanas para serem visíveis no exame.
A prevenção do quadro consiste na correta reposição do sódio, objetivando-se uma variação da concentração sérica do sódio < 0.5 mEq/L/h (8 a 12 mEq/L/dia), sendo os sintomas, muitas vezes, irreversíveis.
Conclusão
A hiponatremia é um distúrbio que pode causar sérias consequências neurológicas, sendo o edema cerebral uma importante causa de morbimortalidade. Saber as indicações e como realizar o tratamento deste paciente, bem como dominar o cálculo de reposição do sódio para prevenir a mielinólise pontina são habilidades fundamentais a todo médico generalista.
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FONTE:
- STERNS, R. H. Overview of the treatment of hyponatremia in adults. UpToDate. 2023
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