A asma é um distúrbio inflamatório crônico das vias aéreas que provoca sintomas como o “chiado”, falta de ar, sensação de aperto no peito e tosse. É uma doença que vem aumentando sua prevalência nos últimos 40 anos no mundo ocidental e, por isso, esse texto irá abordar os principais pontos no manejo do problema.
Fisiopatologia da asma
A asma é caracterizada por obstruções intermitentes e reversíveis das vias aéreas inferiores. Os principais fatores que contribuem para seu desenvolvimento são a predisposição genética para hipersensibilidade à reação tipo I (atopia), a inflamação crônica das vias aéreas e a hipersensibilidade dos brônquios, que provocam hipertrofia e hiper-reatividade das células musculares lisas.
A sua forma clássica, asma atópica, ocorre devido a ativação excessiva das células T auxiliares do tipo 2 (Th2). Neste tipo, há intensa produção de IgE que, ao se conectar com os receptores dos mastócitos liberam seus grânulos e secretam citocinas e mediadores inflamatórios. Esses são responsáveis pelo broncoespasmo, aumento da produção de muco e vasodilatação na árvore brônquica.
Tipos de asma
Como mencionado anteriormente, a asma pode ser classificada em atópica, quando há evidência de sensibilização a um alérgeno (ex.: testes cutâneos), ou em não atópica. A primeira é caracterizada pela intensa resposta Th2, e comumente tem início na infância. Nesses pacientes, é comum a história familiar de asma, rinite alérgica, urticárias e eczemas.
Já na segunda, não há evidência de sensibilização por alérgenos, e os testes cutâneos são comumente negativos. Nela, há uma menor resposta Th2. Sendo esse o tipo mais comum em pacientes que iniciam o quadro de asma na fase adulta. Entretanto, em ambos os tipos, o quadro pode ser desencadeado por infecções respiratórias, irritantes aéreos (ex.: fumaça, vapor), ar frio, estresse e exercício físico.
Por fim, destaca-se também a asma ocupacional, que pode ser desencadeada por vapores, como resinas e plásticos, poeiras orgânicas e químicas (madeira, algodão) e gases, como o tolueno. Entretanto, os episódios comumente ocorrem após uma exposição repetida aos antígenos.
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Quais são os sintomas da asma?
Os sintomas mais característicos da asma são a tosse, dispneia, a sensação de aperto no peito e a sibilância. Tendem a piorar à noite e no início da manhã, e variam quanto a frequência e intensidade ao longo dos dias/semanas. Além disso, costumam ser exacerbados por “triggers” bem conhecidos: alérgenos, mudanças climáticas, gripes, exposição à fumaça e cheiros fortes.
Na maioria das vezes, o exame físico do paciente asmático é normal. Entretanto, ao deflagrar um quadro de asma exacerbada, pode ser possível ouvir roncos e sibilos durante a ausculta pulmonar. Ou ainda, em pacientes com broncoespasmo grave, é possível evidenciar o tórax silencioso, em que não é possível ouvir ruídos respiratórios.
Como é feito o diagnóstico?
O diagnóstico é dado através do quadro clínico característico, associado com a comprovação de limitação ao fluxo aéreo expiratório, sendo a espirometria o exame complementar mais importante. Nesse exame, a relação do volume expiratório forçado no primeiro segundo sobre a capacidade vital forçada (VEF1/CVF) está reduzida para valor < 0,7.
Além disso, deve haver a comprovação da variabilidade de perviedade do fluxo aéreo, através da administração do broncodilatador. Se após a administração desse fármaco houver aumento do VEF1 > 200 mL ou > 12% do valor prévio à administração, comprova-se essa variabilidade.
Avaliação do controle e da gravidade dos sintomas
A graduação da gravidade do paciente com asma é medida através da observação do controle dos sintomas e dos riscos de eventos adversos futuros para este paciente. Entre esses eventos, destacam-se as exacerbações e o declínio acelerado da função pulmonar. Observe as tabelas abaixo.
Além disso, estão elencados a seguir quais são os fatores associados ao aumento de eventos adversos na asma:
- Mal controle clínico
- Baixo VEF1
- Exacerbações frequentes no último ano
- Exposição à fumaça do tabaco
- Admissão prévia em UTI
- Necessidade de uso de medicação em altas doses
Qual o tratamento para asma?
O principal objetivo do tratamento da asma é atingir e manter o controle clínico do paciente. Para isso, são utilizadas medicações de controle, que apresentam propriedades anti-inflamatórias e são utilizadas diariamente e por períodos prolongados, e as medicações de resgate, utilizadas de acordo com a necessidade do indivíduo, com objetivo de reverter rapidamente a broncoconstrição.
Assim, no documento escrito pela Global Initiative for Asthma (GINA) de 2023, o tratamento é subdivido por Steps em 1ª linha e 2ª linha, sendo a 1ª linha o tratamento preferencial, quando disponível.
O uso do corticoide inalatório (CI) associado ao formoterol, um B2-agonista de longa duração (LABA), diminui os riscos de exacerbação e os sintomas, quando comparado ao uso de um B2-agonista de curta duração (SABA) de forma isolada, e é considerado o tratamento de primeira linha pelo GINA 2023.
Isso porque, apesar de ser um broncodilatador de longa duração, o formoterol apresenta início de ação rápido e, dessa forma, o indivíduo pode utilizar o mesmo esquema de CI + LABA para tratamento contínuo (controle) e para as crises de asma.
Entretanto, o esquema terapêutico com CI + LABA apresenta um custo mais elevado, visto que o paciente pode utilizá-lo mais vezes, durante as crises e para a manutenção. Nos casos em que não há acesso a esse esquema terapêutico, recomenda-se o uso do SABA + CI (2ª linha). Todavia, o uso de SABA de forma isolada no tratamento da asma para adultos e adolescentes não é recomendado pelo GINA 2023.
Tratamento de 1ª linha
Step 1-2
O perfil do Step 1-2 apresenta uma asma leve, com ausência de sintomas na maioria dos dias da semana. O esquema terapêutico para o Step 1-2 consiste no uso de dose baixa de CI + formoterol apenas quando o paciente apresentar crises. Esse tratamento reduz o risco de hospitalizações em 65% quando comparado ao uso de SABA de forma isolada.
Step 3
O paciente com o perfil do Step 3 apresenta sintomas na maioria dos dias da semana, ou despertares noturnos devido aos sintomas. Assim, para esses indivíduos, recomenda-se o uso do CI em doses baixas + LABA de forma contínua, ou seja, independente da presença de sintomas.
Step 4
Já o Step 4 deve ser empregado em pacientes que apresentam sintomas diários. Nesses casos, opta-se pelo esquema terapêutico do CI em dose intermediária, associado ao formoterol de forma contínua.
Step 5
O paciente no Step 5 estava previamente no Step 4, entretanto, não apresentou melhora dos sintomas após o tratamento. Para esses indivíduos, considera-se a possibilidade de prescrição de doses altas de CI + formoterol, podendo-se associar ao tratamento um antagonista muscarínico de longa duração (LAMA) ou realizar a fenotipagem do paciente.
Tratamento de 2ª linha
O tratamento de 2ª linha consiste no uso do SABA (aerolin) + CI como medicação de alívio para as crises. Entretanto, muitas vezes, esse esquema apresenta menor adesão por parte do paciente, que passa a utilizar apenas o SABA para alívio dos sintomas e negligencia o uso do CI, que apresenta propriedades anti-inflamatórias indispensáveis para evitar o remodelamento das vias aéreas inferiores.
Step 1
O Step 1 deve ser prescrito para pacientes com sintomas infrequentes, ou seja, até duas vezes por mês. Esse indivíduo pode utilizar o CI + SABA para alívio das crises, sem necessidade de realizar a medicação de forma contínua.
Step 2
O paciente que pode apresentar benefícios com o esquema medicamentoso do Step 2 apresenta sintomas da asma mais de 2 vezes por mês. Entretanto, é assintomático na maioria dos dias. Nesses casos, utiliza-se uma dose baixa de CI de forma contínua, associado ao SABA em caso de sintomas.
Step 3
Assim como aqueles que se fazem uso da 1ª linha de tratamento do GINA, o paciente do Step 3 apresenta sintomas na maior parte dos dias da semana, mas os sintomas não são diários. Ou ainda, apresenta despertares noturnos. Nesses casos, utiliza-se o CI em doses baixas + LABA, de forma contínua. Vale salientar que, o LABA não precisa necessariamente ser o formoterol, visto que já é utilizado o SABA para alívio da crise.
Step 4
Pacientes candidatos ao esquema terapêutico do Step 4 apresentam sintomas diários e, por isso, são necessárias doses intermediárias de CI associados ao LABA de forma contínua.
Step 5
Assim como no tratamento de 1ª linha, o Step 5 da 2ª linha deve ser feito para os pacientes do Step 4 que não apresentaram alívio dos sintomas com o tratamento. Para esses, considera-se o uso de CI em altas doses, associadas ao uso do formoterol, podendo-se adicionar um LAMA e realizar a fenotipagem do paciente, se necessário.
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Seguimento
Após a classificação do indivíduo e a escolha do melhor esquema terapêutico, esse deve retornar para a consulta em período de 1 a 3 meses depois para nova avaliação. A depender das queixas, pode ser necessário realizar o Step Up (progredir o Step do paciente) ou o Step Down (reduzir o Step).
Existem várias razões pelas quais pode ser necessário realizar um Step Up. Entre elas, destacam-se os meses de São João, em que a pessoa pode entrar em contato com a fumaça da fogueira e dos fogos, exacerbando seus sintomas durante aquele período. Ou ainda, quando o paciente realiza exercícios físicos, que também podem evocar uma crise de asma, por exemplo.
Já o Step Down é recomendado para aqueles que tiverem bom controle dos sintomas por pelo menos 3 meses. Entretanto, deve-se ter cautela em realizar o Step Down em pacientes com exacerbações no último ano, ou com limitações persistentes no fluxo aéreo. O objetivo deste é encontrar a menor dose para controle dos sintomas, com diminuição dos custos financeiros para o paciente e com a melhor adesão possível.
Assim, esse é realizado diminuindo em 25% a 50% a dose do CI. Além disso, é possível suspender o LABA, a depender do Step em que o paciente se encontra; contudo, é preciso ter em mente que a suspensão do LABA pode levar à piora dos sintomas do paciente. Por isso, o Step Down deve ser evitado em momentos de infecção, gestação e viagens.
Vacinas
Para mais, na asma grave ou moderada é preciso tomar a vacina da influenza anualmente. O médico também deve orientar sobre a importância de tomar todas as doses da vacina para a COVID-19. E ainda, a vacina pneumocócica, que está disponível no Brasil para todos os pacientes com o tipo grave.
Broncoespasmo induzido por exercício
Em geral, os sintomas da asma ocorrem após o término do exercício físico. Assim, é de fundamental importância o controle adequado do problema, com tratamento regular com CI, aquecimento antes de iniciar a atividade física e treinamento regular para ganho de resistência física. Ademais, é indicado o uso do SABA 15 minutos antes de iniciar a atividade física.
Gravidez
Na gravidez, ocorre um fenômeno conhecido como “regra dos três terços”: 1/3 das pacientes irão apresentar melhora do problema, 1/3 apresentará piora e, em 1/3, a gravidez não irá provocar melhora ou piora no quadro. Nesse público, não é indicada a suspensão dos medicamentos e, portanto, o CI e o LABA devem ser mantidos durante a gestação.
Conclusão
A asma é uma doença crônica e inflamatória das vias aéreas inferiores, com característica de ser variável quanto à frequência e intensidade. Reconhecer a importância dos CI no tratamento da asma, bem como os riscos do uso do SABA de forma isolada são de fundamental importância para o médico generalista.
Continue aprendendo:
- Entenda o manejo da crise de asma em adulto na emergência
- Entenda as Manifestações Sistêmicas e Extrapulmonares da Covid-19
- Derrame pleural: etiologias, sinais e sintomas e tratamento
FONTES:
- GLOBAL INITIATIVE FOR ASTHMA (GINA). Global strategy for the asthma management and prevention. [Fontana]: GINA, 2023. Disponível em: https://ginasthma.org/wp-content/uploads/2023/05/GINA-2023-Full-Report-2023-WMS.pdf. Acesso em: 24/08/2023.
- KUMAR, V. et al. Bases Patológicas das Doenças. Rio de Janeiro: Elsevier, 2018.
- MARTINS, M. R. Manual do Residente de Clínica Médica. 2a edição. Barueri: Manole, 2017.
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