O feocromocitoma é uma doença com incidência anual de aproximadamente 0,8 por 100.000 pessoas-ano, podendo ocorrer em qualquer idade, embora mais comuns na quarta e quinta década, sendo igualmente comum em homens e mulheres. Aproximadamente 40% dos pacientes apresentam a doença como herança familiar autossômica dominante.
O que é Feocromocitoma?
O feocromocitoma é um tipo raro de tumor secretor de catecolaminas (TSC) que surge das células cromafins, as quais estão localizadas na camada medular da adrenal. Os TSCs extra adrenais (10%-15%) são denominados paragangliomas. As células cromafins são análogas aos gânglios simpáticos, os quais também possuem a função de secreção de catecolaminas.
Os sintomas dos feocromocitomas são causados pela hipersecreção tumoral de uma ou combinações das catecolaminas (dopamina, epinefrina, norepinefrina) e o aumento da atividade simpática central também pode estar associado. Seu principal sintoma é a hipertensão arterial, sendo uma das causas de hipertensão secundária.
O feocromocitoma representa cerca de 85% dos TSCs intra-adrenais. Ademais, pacientes com síndrome de Hippel-Lindau, neoplasia endócrina múltipla tipo 2 ou neurofibromatose tipo 1 são fatores de risco para o desenvolvimento de feocromocitoma com uma incidência de 10% a 20%, 50% e entre 2% e 3%, respectivamente. No entanto, a maioria dos tumores secretores de catecolaminas apresentarem-se de forma esporádica.
Aproximadamente 10% de todos os TSCs são metastáticos. Apesar disso, os feocromocitomas malignos são histológica e bioquimicamente iguais aos benignos, sendo sua única pista confiável para a malignidade a invasão local nos tecidos e órgãos circundantes ou metástases à distância. Por isso, mesmo quando considerados benignos no exame anatomopatológico, o acompanhamento a longo prazo é indicado.
Quais os sintomas do feocromocitoma?
Os sintomas estão presentes em aproximadamente 50% dos pacientes com feocromocitoma e, quando presentes, são tipicamente paroxísticos. A hipertensão sustentada ou paroxística é o sinal mais comum, mas cerca de 5% a 15% dos pacientes apresentam pressão arterial normal.
A tríade clássica de sintomas nesses pacientes são: cefaleia episódica, sudorese e taquicardia, mas a maioria dos pacientes não apresentam os três conjuntamente. Outros sintomas incluem palpitações fortes, tremor, palidez, dispneia, fraqueza generalizada e sintomas que mimetizam um ataque de pânico.
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Diagnóstico de Feocromocitoma
O diagnóstico é feito com base na confirmação bioquímica da hipersecreção de catecolaminas, seguida da identificação do tumor com exames de imagem. No entanto, com o uso mais difundido de exames de imagem computadorizados e testes genéticos, um número crescente de pacientes são diagnosticados ainda no estágio pré-sintomático.
Em aproximadamente 60% dos indivíduos, o tumor é descoberto incidentalmente durante a tomografia computadorizada (TC) ou ressonância magnética (RM) do abdômen para sintomas não relacionados. Ainda, os testes bioquímicos podem ser normais em um paciente assintomático com incidentaloma adrenal pobre em lipídios, pois podem ser descobertos na fase "pré-bioquímica".
Deve-se suspeitar e indicar testes de feocromocitoma em pacientes que apresentam um ou mais dos seguintes:
● A tríade clássica com hipertensão ou não;
● Crises hiper adrenérgicas;
● Início de hipertensão em idade jovem, hipertensão resistente ou hipertensão com diabetes mellitus de início recente ou atípico;
● História familiar da doença ou doenças autossômicas dominantes relacionadas;
● Incidentaloma adrenal pobre em lipídios;
● Cardiomiopatia dilatada idiopática;
● História de tumor estromal gástrico ou condromas pulmonares.
Para indivíduos com incidentalomas adrenais, a triagem só deve ser feita se a atenuação da TC sem contraste for superior a 10 unidades Hounsfield. O diagnóstico bioquímico é normalmente feito por medições de metanefrinas e catecolaminas fracionadas na urina e no plasma como mostrado na figura abaixo.
Se houver baixo índice de suspeita é sugerível a coleta urinária fracionada de 24 horas de catecolaminas e metanefrinas urinárias; se houver alto índice de suspeita, metanefrinas fracionadas no plasma parece ser a melhor opção. Um teste positivo para um tumor secretor de catecolaminas inclui um ou mais dos achados a seguir:
→ Metanefrinas e catecolaminas fracionadas na urina de 24 horas:
- Normetanefrina >900 mcg/24 horas ou metanefrina >400 mcg/24 horas;
- Norepinefrina >170 mcg/24 horas;
- Epinefrina >35 mcg/24 horas;
- Dopamina >700 mcg/24 horas
→ Metanefrinas fracionadas no plasma: Os intervalos normais dependem do método utilizado para obter a amostra de sangue:
- Cânula permanente (metanefrina <0,3 nmol/L e/ou normetanefrina <0,66 nmol/L); ou
- Punção venosa (metanefrina <0,5 nmol/L e/ou normetanefrina <0,9 nmol/L ).
Confirmação bioquímica do diagnóstico
Para pacientes com confirmação bioquímica do diagnóstico, o próximo passo é a avaliação radiológica para localização do tumor. A TC ou RM do abdômen e da pelve geralmente é realizada primeiro, sendo sua escolha individual avaliando-se os riscos e benefícios para cada paciente.
Feocromocitoma esporádico
No feocromocitoma esporádico, tanto a TC quanto a RM são bastante sensíveis (98% a 100%), mas têm apenas aproximadamente 70% de especificidade, devido à maior prevalência de incidentalomas adrenais. Procedimentos como amostragem venosa adrenal seletiva e biópsia por agulha guiada por imagem devem ser evitadas por maior risco de complicação.
O teste genético deve ser considerado em todos os pacientes com o problema, sendo geralmente realizado no pós-operatório, após a confirmação do diagnóstico patológico. Desde 1990, 16 genes diferentes de suscetibilidade ao feocromocitoma/paraganglioma foram relatados.
Tratamento para feocromocitoma
Uma vez diagnosticado, todos os indivíduos devem ser submetidos a uma ressecção do feocromocitoma, após preparação médica apropriada. Agentes conhecidos que provoquem paroxismo devem ser evitados. A terapia médica pré-operatória visa controlar a hipertensão e a taquicardia.
O bloqueio combinado alfa e beta-adrenérgico é a primeira abordagem para controlar a pressão arterial e prevenir crises hipertensivas intraoperatórias. O bloqueador alfa-adrenérgico é administrado por pelo menos 7 dias no pré-operatório para normalizar a pressão arterial e expandir o espaço intravascular contraído, podendo durar mais dias em casos específicos.
A fenoxibenzamina é o alfa bloqueador mais utilizado nos Estados Unidos, sendo um agente irreversível, de ação prolongada e inespecífico. A dose inicial é de 10 mg uma ou duas vezes ao dia e a dose é aumentada conforme necessário para controlar a pressão arterial e crises. Eventos adversos possíveis incluem: ortostase, congestão nasal e fadiga acentuada.
No segundo ou terceiro dia do bloqueio alfa-adrenérgico, os pacientes são incentivados a iniciar uma dieta rica em sódio (> 5.000 mg por dia) devido à contração de volume induzida pelas catecolaminas e à ortostase associada ao bloqueio alfa-adrenérgico, sendo contraindicado em pacientes com insuficiência cardíaca congestiva ou insuficiência renal.
Depois que o bloqueio alfa-adrenérgico adequado for alcançado, o bloqueio beta-adrenérgico é iniciado, normalmente dois a três dias antes da cirurgia. O beta-bloqueador nunca deve ser iniciado primeiro, porque o bloqueio dos receptores beta-adrenérgicos periféricos, vasodilatadores com estimulação sem oposição dos receptores alfa-adrenérgicos podem levar a uma elevação adicional da pressão arterial.
O paciente pode receber 10 mg de propranolol a cada seis horas - ou 12,5mg duas vezes ao dia de metoprolol por via oral no primeiro dia do betabloqueador. A dose é então aumentada conforme necessário, para manter a frequência cardíaca entre 60 e 80 batimentos por minuto.
Os bloqueadores de canais de cálcio e a Metirosina (alfa-metil-para-tirosina), a qual inibe a síntese de catecolaminas, podem ser opções secundárias de preparação pré-operatória em casos de controle inadequado ou pacientes com efeitos colaterais intoleráveis.
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Abordagem cirúrgica com adrenalectomia
A adrenalectomia minimamente invasiva pode ser realizada com segurança em mais de 90% dos casos dos feocromocitomas pequenos e solitários que não apresentam características radiológicas malignas, podendo ser total ou parcial.
Pacientes com feocromocitomas familiares apresentam alta incidência de doença bilateral. Dessa forma, a adrenalectomia parcial pode ser considerada a fim de prevenir a deficiência permanente de glicocorticóides. Além disso, alguns tipos têm menos potencial metastático, corroborando com a abordagem.
Se uma adrenalectomia bilateral for planejada no pré-operatório, o paciente deverá receber cobertura de estresse com glicocorticóides enquanto aguarda a transferência para a sala de cirurgia.
As complicações da cirurgia são principalmente devido à hipertensão pré-operatória grave, tumores de alta secreção ou intervenção repetida para recorrência. A dor perioperatória, o tempo de procedimento cirúrgico e de internação hospitalar, as taxas de complicações (arritmias, hipotensão pós-operatória e hipoglicemia) são menores com a laparoscopia quando comparados com a adrenalectomia aberta.
Os fatores perioperatórios associados a eventos perioperatórios adversos incluem: maior tamanho do tumor, duração prolongada da anestesia, níveis aumentados de catecolaminas urinárias pré-operatórias e metabólitos de catecolaminas.
Apesar do preparo pré-operatório, ainda pode ocorrer instabilidade hemodinâmica durante a ressecção cirúrgica. A intubação endotraqueal e a manipulação da glândula adrenal podem induzir a liberação de catecolaminas e, potencialmente, uma crise hipertensiva. As opções de tratamento para crises hipertensivas incluem nitroprussiato de sódio intravenoso, fentolamina ou nicardipina.
Terapias sistêmicas com iobenguano I-131, análogos de somatostatina radiomarcados com, como Lu-DOTATATE, também podem ser úteis em alguns casos de malignidade. Pacientes com tumor maligno irressecável podem se beneficiar ainda do tratamento com temozolomida.
A remoção cirúrgica nem sempre leva à cura a longo prazo do feocromocitoma ou da hipertensão, mesmo em pacientes com tumor benigno, podendo recidivar em cerca de 15% dos casos, sendo mais provável a recidiva em pacientes com feocromocitoma familiar e tumores adrenais direitos. A taxa de recorrência aproximada nos casos de feocromocitoma esporádico é de 3%.
A doença metastática pode ser descoberta até 53 anos após a cirurgia inicial, não existem tratamentos curativos para esses casos, a menos que os locais da doença sejam ressecáveis cirurgicamente. Dessa forma, a maioria dos pacientes deve fazer triagem bioquímica anual.
Conclusão
O feocromocitoma é um tumor raro, mas potencialmente grave das glândulas adrenais caracterizado pela produção excessiva de catecolaminas. Seu rápido diagnóstico essencial para gerenciamento eficaz da condição e o preparo pré-operatório com alfa e beta bloqueadores seguido por remoção cirúrgica do tumor é o tratamento primário. Por fim, um acompanhamento a longo prazo é fundamental, sobretudo nos casos metastáticos, para monitorar o quadro clínico e as possíveis recidivas.
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FONTES:
- Clinical presentation and diagnosis of pheochromocytoma. UpToDate
- Treatment of pheochromocytoma in adults. UpToDate
- Young WF Jr. Pheochromocytoma: 1926-1993. Trends Endocrinol Metab. 1993 May-Jun;4(4):122-7. doi: 10.1016/1043-2760(93)90035-d. PMID: 18407145
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