Endocrinologia
Endocrinologia

Hipercalcemia: o que é, causas, sintomas e tratamento

Logo Medclub
Equipe medclub
Publicado em
7/1/2025
 · 
Atualizado em
7/1/2025
Índice

A hipercalcemia é um problema relativamente comum de ser visto nos pacientes, estar de olho nesse distúrbio é extremamente importante pelo médico pois poderá nos indicar doenças graves, como malignidade e hiperparatireoidismo primário. Neste artigo, iremos revisar o que há de mais atualizado sobre o distúrbio, suas causas, como ela se manifesta clinicamente e como pode ser tratada. 

O que é hipercalcemia?

O cálcio é o mineral mais abundante no corpo humano, sua presença é extremamente importante pois ela faz parte da mineralização de ossos e dentes, além de fazer parte de diversos eventos intracelulares, como condução nervosa, contração muscular e coagulação sanguínea

Os níveis de cálcio anormais podem nos indicar que aquele corpo pode estar com algum distúrbio no metabolismo mineral, o que resulta em complicações clínicas sérias em diversos sistemas, como o cardiovascular, renal e neuromuscular. Quando a quantidade sérica de cálcio fica elevada, chamamos de hipercalcemia, comumente acima de 10,5 mg/dL

O que causa hipercalcemia?

A hipercalcemia decorre de uma entrada de cálcio na circulação sanguínea superior à sua excreção pela urina, ou à sua deposição nos ossos. Esse desbalanço pode acontecer por diferentes mecanismos, como pela reabsorção óssea acelerada, absorção gastrointestinal excessiva, diminuição da excreção renal de cálcio, ou ainda pela combinação desses fatores. 

Fisiologia do cálcio no organismo. Fonte: Tratado de Fisiologia Médica, 2021
Fisiologia do cálcio no organismo. Fonte: Tratado de Fisiologia Médica, 2021

Dentre todas as causas de hipercalcemia, devemos ter uma atenção especial a duas causas: Hiperparatireoidismo primário e malignidade, uma vez que, juntas, respondem por mais de 90% dos casos

Causas mediadas pela paratireoide 

Ações diretas e indiretas do PTH no metabolismo do cálcio e do fósforo. Fonte: Dra. Suzana vieira
Ações diretas e indiretas do PTH no metabolismo do cálcio e do fósforo. Fonte: Dra. Suzana vieira

Hiperparatireoidismo primário 

Causado principalmente devido a um adenoma da paratireoide, o hipertireoidismo primário causa um aumento da ativação dos osteoclastos, mediados pelo hormônio paratireoide (PTH), causando um aumento da reabsorção óssea e da absorção intestinal de cálcio. 

Nessa doença, a hipercalcemia pode ser discreta, ou ainda ser intermitente. Por isso, poderá ser necessário a realização de medições seriadas do cálcio sérico para possibilitar o diagnóstico do hiperparatireoidismo intermitente 

Hiperparatireoidismo secundário e terciário  

O curso fisiopatológico que leva ao hiperparatireoidismo terciário começa com a ocorrência de Doença Renal Crônica (DRC) grave, que causa redução da síntese de 1,25-di-hidroxivitamina D e, consequentemente, concentrações reduzidas de cálcio. Porém, mecanismos de feedback proporcionam um aumento compensatório do PTH sérico (hiperparatireoidismo secundário), que, cronicamente, leva à hiperplasia da glândula paratireoide

Ademais, podemos ver também em alguns pacientes com insuficiência renal prolongada e avançada, em que a hiperplasia da paratireoide pode progredir ao ponto de que a secreção de PTH não seja mais suprimida por concentrações elevadas de cálcio sérico. 

ATENÇÃO! O hiperparatireoidismo terciário é bastante grave, se instala após um hiperparatireoidismo secundário prolongado e causa hipercalcemia severa. Pacientes com DRC crônica que são submetidos a transplante renal podem melhorar da hiperplasia da glândula paratireoide. Porém, em alguns casos, o paciente pode ficar com hiperparatireoidismo transitório ou com permanência da hiperplasia da paratireoide. 

Hipercalcemia hipocalciúrica familiar 

A hipercalcemia hipocalciúrica familiar, por sua vez, é uma doença genética autossômica dominante rara, caracterizada por hipercalcemia leve; hipocalciúria; concentrações séricas de magnésio normais a moderadamente elevadas e concentrações séricas de PTH normais a ligeiramente aumentadas

Felizmente, pacientes que são acometidos por essa doença apresentam poucos sintomas, quando estão presentes, de hipercalcemia, não precisando de terapia. 

Condrodisplasia metafisária

Forma rara de nanismo, relacionado com uma mutação no gene do receptor PTH-ΡТΗrΡ , que resulta em ativação contínua do receptor em níveis normais ou baixos de secreção do PTH. 

{{banner-cta-blog}}

Não mediado pela paratireoide 

Malignidade 

A hipercalcemia é bastante frequente nos pacientes com malignidade, com valores superiores à hipercalcemia do hiperparatireoidismo (valores acima de 13 mg/dL). Assim, na presença de um distúrbio bastante elevado, a malignidade deve ser a principal hipótese. 

Porém, a fisiopatologia de como a hipercalcemia da malignidade se estabelece depende do tipo de tumor. Por exemplo: Nos casos de malignidade com metástases ósseas, ocorre uma indução direta de osteólise local pelas células tumorais, diante do aumentos de certas citocinas, enquanto que o distúrbio de causa maligna com tumores sólidos não metastáticos, a causa mais comum é a secreção da PTHrP

Hipervitaminose D 

As altas concentrações séricas de 25-hidroxivitamina D (calcidiol) ou 1,25-di-hidroxivitamina D (calcitriol) estão relacionados com a hipercalcemia por aumentar a reabsorção óssea e a absorção de cálcio. 

Medicamentos 

Diversos medicamentos podem levar ao problema, diretamente ou indiretamente, através da indução de um hiperparatireoidismo. Temos como exemplo o uso de lítio, que frequentemente leva ao aumento do PTH em tratamentos crônicos, provocando um leve hiperparatireoidismo. Além disso, os diuréticos tiazídicos, drogas bastante usadas para casos de hipertensão arterial, também podem levar a um hiperparatireoidismo naqueles pacientes predispostos,  por reduzir a excreção urinária de cálcio. 

Pacientes com osteoporose também devem sempre estar sob vigilância ativa quanto ao risco de hipercalcemia, visto que análogos de PTH e PTHrP que aumentam a formação óssea podem causar hipercalcemia transitórias. O aumento da ingestão de cálcio pode ser também aconselhada para esses pacientes. Nesse caso, a alta ingestão do mineral geralmente não causa o problema, porém, quando o paciente o possui associado a uma insuficiência renal crônica, a ingestão elevada pode precipitar o problema. 

Ademais, a hipervitaminose da vitamina A também causa aumento da reabsorção óssea, gerando hipercalcemia em cerca de 30% dos casos. 

Distúrbios endócrinos 

Tireotoxicose 

Cerca de 15% a 20% dos pacientes com tireotoxicose desenvolvem uma hipercalcemia leve, devido ao aumento da reabsorção óssea mediada pelos hormônios da tireoide. Porém, com o tratamento do hipertireoidismo, a hipercalcemia tende a melhorar. 

Feocromocitoma

Apesar de bastante raro, a feocromocitoma pode culminar em hipercalcemia, tanto pelo próprio tumor ou pelo estabelecimento de um hiperparatireoidismo. 

Insuficiência adrenal 

Nesse caso, pacientes em crise adrenal (crise addisoniana) podem ter hipercalcemia por uma série de fatores: aumento da reabsorção óssea, contração de volume e aumento da reabsorção tubular de cálcio. Felizmente, a administração de cortisol reverte o distúrbio em poucos dias. 

ATENÇÃO!

 Existem ainda algumas causas diversas que não se encaixam nas causas acimas, como o acontecimento de rabdomiólise associada à insuficiência renal aguda e a deficiência congênita de lactase

Quais os sintomas de hipercalcemia? 

Diante da grande importância do cálcio para diversos mecanismos que promovem a homeostase no nosso corpo, a disfunção causa repercussões em múltiplos sistemas, o que pode ser manifestada por vários sintomas. Esses sintomas podem variar principalmente conforme o grau de elevação da calcemia. 

Hipercalcemia leve

Aqueles pacientes que possuem o cálcio acima do limite superior do normal, mas com valores abaixo de 12 mg/dL. Nessa faixa, os indivíduos geralmente são assintomáticos, ou apresentam sintomas inespecíficos, como constipação, fadiga e depressão. 

Hipercalcemia moderada 

Apresentam cálcio sérico entre 12 e 14 mg/dL. Em um um contexto crônico, essa faixa pode ser bem tolerada, porém, quando o aumento for agudo, os sintomas podem ser mais acentuados: poliúria, polidipsia, desidratação, anorexia, náuseas, fraqueza muscular, até alterações no estado mental

Hipercalcemia grave

Aqui, os pacientes já se encontram com valores de calcemia acima de 14 mg/dL, apresentando progressão dos sintomas observados em pacientes com hipercalcemia moderada e aguda. 

Manifestações neuropsiquiátricas 

A literatura descreveu uma correlação de pacientes com hiperparatireoidismo leve e hipercalemia com sintomas neuropsiquiátricos, como ansiedade, pressão alta e disfunção cognitiva

Sintomas graves, como letargia, confusão mental e coma podem ainda ocorrer em hipercalcemias moderadas a grave de qualquer etiologia, presentes principalmente em pessoas mais idosas e que apresentam aumentos mais agudos da calcemia. 

Manifestações gastrointestinais 

Os sintomas gastrointestinais estão bem presentes na hipercalcemia: diarreia, anorexia e náusea são os principais e ocorrem com relativa frequência. 

Manifestações por alterações renais 

Dentre as manifestações renais mais importantes, estão a poliúria, a litíase renal aguda e crônica. 

Em até 20% dos pacientes, a hipercalcemia crônica leva a problemas na capacidade de concentração e sintomas de poliúria e polidipsia. Ela também pode resultar em nefrolitíase, especialmente associada ao hiperparatireoidismo primário e sarcoidose, pela produção aumentada de calcitriol. A acidose tubular renal distal (ainda que bastante rara) e a insuficiência renal também estão associadas a quadros graves.

Manifestações cardiovasculares

Foi evidenciado que a hipercalcemia aguda está relacionada com um encurtamento do intervalo QT, devido à diminuição do potencial de ação do miocárdio. No caso do tipo grave, foi descrito o surgimento de arritmias e elevação do segmento ST, simulando um infarto agudo do miocárdio. 

No caso de pacientes com hiperparatireoidismo de longa duração, pode ocorrer algumas anormalidades cardíacas, como deposição de cálcio nas válvulas cardíacas, artérias coronárias e fibras musculares, além de hipertensão e cardiomiopatia

{{banner-cta-blog}}

Diagnóstico 

Para o diagnóstico, devem ser medidos os níveis de cálcio sérico em exames laboratoriais. Geralmente, é avaliado apenas o cálcio total, mas, em algumas situações, pode ser medido também o cálcio ionizado, pois o cálcio total pode sofrer influências pela albumina. Porém, para o diagnóstico ser completo, é preciso também identificar a causa da disfunção

Consideramos um cálcio sérico alto quando está em níveis superiores a 10,5 mg/dL. Contudo, também é importante corrigir o valor conforme os níveis de albumina sérico, por influenciar a quantidade de cálcio ligado. Para isso, podemos medir a fração biologicamente ativa, por não ser afetado pela albumina, que é o cálcio ionizado. Nele, os valores normais variam entre 4,4 e 5,2 mg/dL

Como a etiologia é essencial para o diagnóstico, não podemos deixar de fazer uma avaliação do PTH do paciente, assim como do PTHrP (Peptídeo relacionado ao PTH), para investigar a presença de hiperparatireoidismo primário e malignidade (para os casos de tumores que secretam PTHrP).

No caso de normalidade do PTH e do peptídeo relacionado ao PTH, outras causas devem ser investigadas, como a de uma hipercalcemia por elevação da vitamina D. Assim, deverá ser solicitado dosagem da 25-hidroxivitamina D e 1,25-Dihidroxivitamina D, exames de imagem e outros exames complementares que colaborem para o diagnóstico correto.    

Tratamento 

O tratamento deve ser focado na redução da concentração sérica do mineral e, quando possível, no tratamento da doença subjacente. O artigo irá focar no tratamento da redução da calcemia, que será dividido conforme a gravidade da concentração sérica. 

Hipercalcemia leve 

No caso das hipercalcemias leves ou que apresentam poucas repercussões clínicas, o tratamento não precisa ser imediato. Porém, é importante que o médico oriente seu paciente quanto a importância de evitar alguns fatores que podem agravá-la, como: diuréticos tiazídicos; lítio; depleção de volume; dieta rica em cálcio; suplementação de cálcio e vitamina D. 

Hipercalcemia Moderada 

Quando a hipercalcemia é moderada e crônica, os sintomas também poderão ser leves. Nesse contexto, as orientações são as mesmas que para a hipercalcemia leve. Porém, em casos de sintomas mais intensos, geralmente com aumentos mais agudos, será preciso uma terapia mais agressiva. Os pacientes serão tratados com hidratação salina e bifosfonatos

Hipercalcemia grave 

Nos pacientes com hipercalcemia grave e sintomáticos, com letargia e estupor, precisarão passar por terapia agressiva, que inclui a administração simultânea de solução salina isotônica intravenosa e calcitonina subcutânea, por resultar em redução significativa da calcemia dentro de 12 a 48 horas. Além disso, o bifosfato, como o ácido zoledrônico IV, é usado no segundo ao quarto dia de tratamento, mantendo um efeito mais sustentado da redução sérica desejada. 

Conclusão 

A hipercalcemia é um distúrbio metabólico significativo que pode indicar condições graves, como malignidade e hiperparatireoidismo primário. A compreensão das causas, sintomas e opções de tratamento é essencial para a identificação e manejo eficaz dessa condição. 

Os níveis elevados de cálcio podem provocar repercussões em diversos sistemas do corpo, destacando a importância de um diagnóstico preciso e um acompanhamento rigoroso. O tratamento deve ser adaptado à gravidade da hipercalcemia, variando de orientações simples a intervenções terapêuticas intensivas. Para mais, a investigação das causas subjacentes são cruciais para prevenir complicações e melhorar a qualidade de vida dos pacientes afetados.

Continue aprendendo:

FONTES:

  • Lafferty FW. Differential diagnosis of hypercalcemia. J Bone Miner Res 1991; 6 Suppl 2:S51.
  • Walker MD, Shane E. Hypercalcemia: A Review. JAMA 2022; 328:1624.
  • Jacobs TP, Bilezikian JP. Clinical review: Rare causes of hypercalcemia. J Clin Endocrinol Metab 2005; 90:6316.
  • Bilezikian JP. Clinical review 51: Management of hypercalcemia. J Clin Endocrinol Metab 1993; 77:1445.
  • Bilezikian JP. Management of acute hypercalcemia. N Engl J Med 1992; 326:1196.

+400 de aulas de medicina para assistir totalmente de graça

Todas as aulas são lideradas por autoridades em medicina.

Artigo escrito por

Tenha acesso a todos os conteúdos totalmente de graça

Através de um simples cadastro, você estará livre para consumir o que quiser do medclub!

Dúvidas?

O que é o MedClub?

O medclub é uma plataforma 100% gratuita focada no desenvolvimento e capacitação profissional dos médicos. Com videoaulas e materiais de apoio de alta qualidade, o médico é alavancado em uma dinâmica simples, clara e objetiva de atualização e aprimoramento dos conhecimentos essenciais à sua prática.

Como o MedClub pode me beneficiar?

O Medclub te proporciona a aplicabilidade prática da Medicina Baseada em Evidências, elevando o padrão da sua prática médica. Tudo isso em um só lugar, sem perda de tempo, com informações claras e fáceis de achar no dia a dia.

O MedClub beneficia médicos de diferentes níveis de experiência?

Sim! O MedClub foi cuidadosamente concebido e desenvolvido com o objetivo de simplificar o estudo e a atualização médica, proporcionando maior segurança nas práticas e procedimentos. Nossa plataforma visa melhorar os resultados diários dos médicos, abordando as principais preocupações independentemente do estágio de sua carreira.

Nós utilizamos cookies. Ao navegar no site estará consentindo a sua utilização. Saiba mais sobre o uso de cookies.