A miocardite, apesar de rara, pode ter consequências graves se não for diagnosticada e tratada de forma adequada. Dessa forma, compreender as nuances dessa condição é fundamental, não apenas para o manejo clínico desses pacientes, como também para a prevenção de complicações que podem comprometer a função cardíaca a longo prazo.
O que é miocardite?
A miocardite, também denominada cardiomiopatia, representa um grupo de doenças que envolvem o músculo cardíaco. Assim, são inclusas doenças que afetam diretamente o músculo cardíaco, bem como doenças sistêmicas que alteram a anatomia e os cardiomiócitos de forma indireta.
Para mais, a European Society of Cardiology classifica as miocardites em dilatada, hipertrófica, restritiva e arritmogênica de ventrículo direito. A forma dilatada representa 90% dos casos das cardiomiopatias e, por isso, será o foco deste texto. Para mais, a sociedade europeia também classifica as cardiomiopatias em familiar (genética) e não familiar (não genética). Observe o esquema abaixo.
Miocardite dilatada
Na cardiomiopatia dilatada (CMD), há comprometimento da função ventricular esquerda, ou de ambos os ventrículos. E ainda, é frequentemente acompanhada por arritmias e tromboembolismo, com posterior evolução para insuficiência cardíaca importante.
Por isso, é frequentemente a via final de diversas doenças que comprometem o miocárdio das mais diversas etiologias: genética, infecciosa, metabólica, inflamatória ou citotóxica. Todavia, não é a via final da hipertensão arterial sistêmica, isquemia miocárdica, doença pericárdica ou congênita, sendo necessária a exclusão dessas etiologias para se firmar o diagnóstico de CMD.
{{banner-cta-blog}}
Miocardite hipertrófica
Já a cardiomiopatia hipertrófica é, assim como a CMD, uma doença primária do coração, sendo caracterizada pela dilatação ventricular na ausência de outra doença cardíaca ou sistêmica que justifique esses achados. Tem prevalência estimada de 0,2% na população geral, e mortalidade de 0,9% a 3% ao ano.
Para mais, é a mais frequente das cardiopatias de etiologia genética, apresentando transmissão autossômica dominante. Além disso, é a principal causa de morte súbita em pacientes jovens e em atletas.
Miocardite restritiva
As miocardites representam um grupo heterogêneo de doenças, apresentando-se tipicamente com disfunção diastólica importante, aumento dos átrios e espessamento das paredes ventriculares em algumas patologias específicas, como na amiloidose e na doença de Fabry.
Dessa forma, a cardiomiopatia restritiva é caracterizada por uma rigidez do miocárdio, com consequente redução do relaxamento, comprometendo dessa forma o enchimento ventricular e o volume diastólico final de ambos os ventrículos. Para mais, a maioria dos casos são secundários a desordens sistêmicas, como a sarcoidose e a esclerodermia.
Causas da miocardite
Quais os sintomas da miocardite?
O paciente com cardiomiopatia dilatada, ou outras formas, pode passar muitos anos assintomático. Todavia, quando presentes, os sintomas da insuficiência cardíaca são os mais comuns. Entretanto, distúrbios elétricos como as arritmias ventriculares/ supraventriculares e anormalidades no sistema de condução são frequentes e, por isso, deve-se sempre interrogar o paciente acerca de história de síncope ou pré-síncope.
Nos pacientes sintomáticos, ele pode estar taquipneico, podendo ser evidenciado o padrão de Cheyne-Stokes, associado a pior prognóstico. A pressão arterial pode estar baixa e as extremidades frias, refletindo o baixo débito cardíaco com má perfusão periférica. E ainda, outros sintomas de insuficiência cardíaca, como turgência jugular, hepatomegalia e edema de membros inferiores são achados comuns.
No exame físico do precórdio, pode-se observar desvio do ictus cordis, e presença de bulhas B4 e B3 em ritmo de galope, este último sendo mais frequentemente evidenciado nos pacientes com insuficiência cardíaca descompensada. Nos pacientes com insuficiência mitral por dilatação da válvula, pode-se auscultar um sopro holossistólico com irradiação para região axilar e dorso.
Diagnóstico
Para confirmar o diagnóstico de CMD, deve-se investigar todas as possíveis etiologias, sendo a exclusão da doença arterial coronariana, portanto, fundamental. Observe a tabela abaixo com os principais exames a serem solicitados na miocardiopatia dilatada e suas indicações.
Tratamentos para a miocardite
Os objetivos do tratamento na miocardiopatia dilatada são o controle da insuficiência cardíaca (IC), a prevenção dos sintomas de progressão da doença, e a prevenção de fenômenos tromboembólicos e morte súbita.
Por isso, nos pacientes com disfunção ventricular ou insuficiência cardíaca, indica-se iniciar o tratamento farmacológico com betabloqueadores (carvedilol, succinato de metoprolol e bisoprolol) e inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA). Em caso de intolerância ao IECA devido a tosse, indica-se substituir a medicação por um bloqueador de angiotensina II (BRA).
{{banner-cta-blog}}
Para mais, nos pacientes sintomáticos (NYHA ≥ II) com fração de ejeção (FEVE) < 35%, deve-se associar a espironolactona ao IECA e betabloqueador. E mais, na IC com fração de ejeção reduzida (ICFEr) sintomática, apesar do tratamento otimizado, pode-se substituir o IECA pelo sarcubitril-valsartana, visto que essa droga demonstrou redução de mortalidade e internações hospitalares nesses pacientes.
O nitrato com a hidralazina está indicado para os pacientes com alteração de função renal e hipercalemia pelo uso de IECA ou BRA. E ainda, pode ser utilizado com o esquema usual em pacientes afrodescentes que mantêm sintomas apesar da terapia otimizada.
Ainda para os pacientes com ICFER, recomenda-se iniciar os inibidores de SGLT-2 (dapaglifozina e empaglifozina), que tem como mecanismo de ação induzir a glicosúria ao inibir o co-transportador de sódio e glicose tipo 2 nos túbulos renais. Observe o esquema abaixo.
Os diuréticos de alça, como a furosemida, podem ser utilizados nos quadros de congestão pulmonar e edema periférico para controle dos sintomas. Além desses, a digoxina melhora o inotropismo cardíaco, e a amiodarona é útil no controle de arritmias, podendo ambas as medicações serem prescritas controle dos sintomas. Todavia, essas medicações não apresentam impacto na sobrevida.
Para além dos métodos farmacológicos para tratamento da ICFEr, observe abaixo a tabela com métodos não-farmacológicos no tratamento destes pacientes e suas principais indicações, expostos anteriormente no fluxograma acima.
Conclusão
A miocardite continua a representar um desafio clínico significativo, exigindo dos médicos uma avaliação minuciosa. O avanço das técnicas diagnósticas e terapêuticas tem melhorado o prognóstico, mas a chave para um desfecho favorável reside na identificação precoce e na intervenção adequada.
Continue aprendendo:
- Trombose Venosa Profunda: causa, sintomas, diagnóstico e tratamento
- Insuficiência venosa periférica: o que é, causa e diagnóstico
- Síndrome da veia cava superior: causas, sintomas e como tratar
FONTES:
- JATENE, I. B., et al. Tratado de Cardiología SOCESP. 5ª ed. Santana de Parnaíba (SP): Manole, 2022
- SOEIRO, A. M., et al. Manual da Residência em Cardiologia. 2ª ed. Santana de Parnaíba (SP): Manole, 2022
- MARCONDES-BRAGA, F. G. et al. Atualização de Tópicos Emergentes da Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca – 2021. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 116, n. 6, p. 1174–1212, jun. 2021
+400 de aulas de medicina para assistir totalmente de graça
Todas as aulas são lideradas por autoridades em medicina.