Por: Ellen Kosminsky
A fibromialgia (FM) é um distúrbio reumatológico. É considerado a causa mais comum de dor musculoesquelética difusa, e tem prevalência estimada de 2.5% nas mulheres brasileiras. Equivale a 30% das consultas reumatológicas e 5% das consultas na clínica médica.
Ela acomete todas as faixas etárias, tendo pico de incidência entre 25 e 65 anos, com média de idade de 49 anos. E mais, há maior prevalência no sexo feminino (10-15:1). Para mais, a fibromialgia é uma entidade de distribuição universal, ou seja, não há diferenças significativas entre pacientes de diferentes condições socioeconômicas e etnias.
O que é fibromialgia?
A fibromialgia é definida como uma síndrome de dor crônica musculoesquelética generalizada, de causa não inflamatória e não autoimune. Sendo definida pela presença da dor por > 3 meses, sem a função biológica de alerta. A “dor generalizada” é caracterizada pela presença de dor nas seguintes localizações: 1) abaixo e acima da cintura; 2) nos lados direito e esquerdo do corpo e; 3) em pelo menos um segmento da coluna vertebral.
Além disso, a dor do paciente é considerada uma dor nociplástica, ou seja, é proveniente de uma nocicepção alterada, com ausência de dano tecidual que ative os receptores nociceptores periféricos, bem como ausência de lesões ou doenças do sistema somatossensitivo que cause a dor.
Além disso, há comumente a associação com sintomas como a fadiga, distúrbios do sono e distúrbios cognitivos. E mais, a doença associa-se a outras síndromes funcionais, como a síndrome do intestino irritável, a enxaqueca e a dor pélvica crônica. Por fim, o exame físico apresenta pontos muito dolorosos à palpação em locais anatômicos pré-determinados.
Causas
Traços de personalidade como o perfeccionismo e o detalhismo estão associados à fibromialgia, isso evidencia uma predisposição genética para o seu desenvolvimento. Além disso, traumas físicos, infecções por agentes como a hepatite C e o Epstein-Barr vírus (EBV), bem como experiências ruins na infância, com abuso sexual e físico, são fatores de risco relevantes.
E mais, estresse emocional, crenças catastrofizantes, depressão e ansiedade são fatores de risco para o desenvolvimento da doença. Distúrbios do sono e a presença de outros distúrbios que provocam dor, como o lúpus eritematoso sistêmico (LES), também são fatores de risco relevantes.
Para mais, a fibromialgia é uma desorganização do processamento dos estímulos de dor à nível central, como apontam inúmeras evidências. Assim, acredita-se que ocorra uma diminuição do sistema analgésico endógeno do indivíduo, provocando uma somatização temporal da dor. Sendo essa caracterizada por uma maior sensibilidade a estímulos dolorosos quando comparados com a população geral.
Além disso, há uma hipersensibilidade para estímulos sensoriais, como o sistema olfativo, visual e auditivo. Por isso, depois de haver estímulos repetitivos não dolorosos há uma diminuição na capacidade de inibição de estímulos sensoriais irrelevantes. Os pacientes também apresentam alteração dos receptores opióides, com upregulation nas periferias e downregulation dos receptores cerebrais.
Para mais, são fatores geradores e moduladores da FM o estresse emocional e os processos infecciosos, destacando-se as infecções virais. Bem como os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho. Além disso, são também fatores moduladores/geradores os traumas físicos, como acidentes, e as cirurgias de grande porte.
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Quando suspeitar?
Cerca de 80% dos pacientes apresentam fadiga diurna e sono não-reparador - podendo essas serem as principais queixas durante a consulta - dor generalizada, de característica imprecisa e com localização axial e periférica. O paciente pode referir dor em queimação, em pontada, dor “surda” ou “cansada”, e pode referir parestesias.
E mais, comumente, a dor ocorre em 6 locais: cabeça, braços, tórax, abdome, pernas e dorso/espinha. Além disso, frequentemente queixam-se de dores musculares e nas articulações, podendo relatar “inchaço” no local. Entretanto, no exame físico não é possível visualizar este edema.
A fadiga é um sintoma quase sempre presente, podendo ser física ou mental. Pacientes com FM comumente queixam-se de dores por todo corpo, bem como de sensação de que “está sempre resfriado”. Além disso, é comum a rigidez matinal e sensação de cansaço, mesmo após longas horas de sono. E mais, o indivíduo geralmente tem sono leve, acordando frequentemente durante o sono e muito cedo pela manhã. Por fim, pacientes com FM relatam, com frequência, dificuldades de retorno para o sono.
Os distúrbios cognitivos, doenças psiquiátricas (30% a 50% dos pacientes apresentam ansiedade e/ou depressão) e a cefaleia tensional (50%) e enxaqueca são frequentes nesses pacientes. A presença de tonturas, precordialgias de caráter atípico, síndrome do intestino irritável e a síndrome da uretra feminina.
Além disso, são sintomas autonômicos frequentes no paciente com FM a hipotensão ortostática, o fenômeno de Raynaud e a taquicardia. Bem como a xeroftalmia e a perda da acuidade auditiva. Sendo essa última cinco vezes mais comum nessa população. O exame neurológico é sempre normal, não havendo perda do tônus, redução da amplitude dos movimentos ou da força.
Como é feito o diagnóstico?
O diagnóstico da fibromialgia é clínico. Para dar o diagnóstico de fibromialgia, atualmente, utiliza-se a Escala de Gravidade dos Sintomas (EGS) e o índice de Dor Generalizada (IDG). A pontuação máxima na Escala de Gravidade dos Sintomas é de 12 pontos. Observe a tabela abaixo.
Já a pontuação máxima do Índice de Dor Generalizada é 19 pontos. A cada local a que o paciente referir dor, soma-se um ponto. Ele deve apresentar dor generalizada em pelo menos 4 das 5 regiões: região superior esquerda, superior direita, inferior direita, inferior esquerda e região axial. Essa última correspondendo a dores em região cervical, torácica ou lombar. Observe a tabela abaixo.
Por fim, o diagnóstico é estabelecido quando for apresentado IDG ≥ 7 e EGS ≥ 5, ou IGD entre 4 e 6 pontos e EGS ≥ 9. Além disso, esses sintomas devem estar presentes por pelo menos 3 meses. E mais, o diagnóstico, de acordo com os critérios mais recentes, é válido independentemente da presença de outros diagnósticos concomitantes que possam justificar a dor, como o hipotireoidismo e o LES.
Além disso, nos exames laboratoriais ou de imagem nada de anormal é visualizado. Todavia, deve-se solicitar provas inflamatórias (velocidade de hemossedimentação - VHS- ou proteína-C reativa -PCR-), com objetivo de descartar causas inflamatórias para o quadro do paciente. Além disso, solicita-se o hemograma completo, também para auxílio do diagnóstico diferencial.
Além disso, solicita-se também TSH, T4 livre, PTH e cálcio, a fim de avaliar endocrinopatias como hipotireoidismo e o hiperparatireoidismo. E mais, enzimas hepáticas (TGO e TGP), ureia e creatinina e CPK, esta última para excluir possíveis lesões musculares. Por fim, marcadores de doenças autoimunes, como o FAN e o fator reumatóide, não devem ser pesquisados caso não haja indícios sugestivos de doenças imunomediadas.
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Tratamento para a fibromialgia
O processo terapêutico passa pelo tratamento farmacológico e no tratamento não farmacológico. Neste último, englobam-se três pilares: a educação do paciente sobre sua doença, a prática de exercícios físicos e a terapia psicológica.
Tratamento não farmacológico
As medidas não farmacológicas consistem na educação sobre a doença. Assim, deve-se reafirmar o caráter benigno e cônico da FM, enfatizando ao paciente a importância da adesão ao tratamento. Para mais, recomenda-se que seja realizadas terapias a fim de reduzir o estresse, como a terapia cognitivo comportamental.
O paciente comumente apresenta cinesiofobia, medo de realizar atividades físicas. Entretanto, deve-se indicar um programa de atividades físicas que contenha exercícios aeróbicos de baixo impacto e fortalecimento, visto que o sedentarismo é um importante fator de risco para o desenvolvimento da doença.
Para mais, é fundamental informar que, logo no início, é possível que os sintomas de mialgia aumentem, mas que são temporários e tendem a regredir.
Tratamento Farmacológico
A terapia farmacológica de primeira linha para alívio dos sintomas não reduzidos com a terapia não farmacológica são os antidepressivos. Para esses pacientes, recomenda-se iniciar o tratamento com uma dose baixa de antidepressivos tricíclicos, como a amitriptilina, na dose de 10 mg, preferencialmente uma a duas horas antes do paciente deitar-se para dormir.
Alternativamente, para os pacientes com sintomas leves a moderados, o uso de miorrelaxante pode ser uma boa opção terapêutica. Assim, prescreve-se a ciclobenzaprina, na dose de 5 a 30mg antes do paciente dormir. A terapia com anticonvulsivantes, a exemplo da pregabilina, é feita para indivíduos com distúrbio do sono severo.
O uso de opióides fracos, como o tramadol na dose de 100 a 200 mg/dia podem ser indicados para cenários de agudização da dor. Todavia, o uso de opióides de forma crônica deve ser evitado nos pacientes com dores crônicas. Por fim, drogas como corticosteróides e anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) não apresentam nenhum efeito benéfico.
Conclusão
A fibromialgia é uma condição predominante na sociedade, afetando esses pacientes de forma significativa. Dessa forma, reconhecer os principais sintomas da fibromialgia é fundamental para realizar o diagnóstico. E mais, conhecer as principais medicações utilizadas no tratamento da FM é uma habilidade fundamental para todo médico generalista.
Portanto, para suspeitar do diagnóstico é preciso reconhecer os principais aspectos da sintomatologia. Além de saber como tratar o problema, seja por meio do tratamento farmacológico ou não farmacológico.
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