A vaginose bacteriana (VB) é a principal causa de secreção vaginal anormal em mulheres em idade reprodutiva, contribuindo para aproximadamente 40% a 50% dos casos de corrimento vaginal. A doença é caracterizada por uma alteração no equilíbrio da microbiota vaginal, resultante do aumento das bactérias anaeróbias em relação às bactérias Lactobacillus, as que normalmente predominam na flora vaginal saudável.
O que é a vaginose bacteriana?
Diferente da vaginite (inflamação da vagina caracterizada por rubor, calor, prurido e dor), a vaginose bacteriana é uma alteração da microbiota vaginal que pode causar sintomas ou não. Os mecanismos relacionados ao desenvolvimento dela são:
- Microbiota vaginal alterada e disbiose – Na VB ocorre uma redução na concentração dos lactobacilos normalmente dominantes, que produzem peróxido de hidrogênio e ácido láctico, e um aumento na concentração de outros organismos, especialmente anaeróbios Gram-negativos.
- Espectro bacteriano – Mulheres com VB tiveram uma média de 12,6 filotipos (variação de 9 a 17) por amostra, em comparação com 3,3 filotipos (variação de 1 a 6) por amostra em mulheres sem VB.
- Produção de aminas – Com a perda de lactobacilos produtores de peróxido de hidrogênio, o pH aumenta e ocorre um crescimento excessivo de anaeróbios vaginais, os quais produzem enzimas proteolíticas que decompõem os peptídeos vaginais em uma variedade de aminas que são voláteis, malcheirosas e associadas ao aumento da transudação vaginal.
- Aumento resultante do pH vaginal para > 4,5 (o pH vaginal normal de mulheres estrogenizadas normalmente varia de 4,0 a 4,5).
O que causa vaginose bacteriana?
Diversas bactérias podem estar associadas a vaginose bacteriana (Gardnerella vaginalis, espécies Prevotella, espécies Porphyromonas, espécies Bacteroides, espécies Peptostreptococcus , Mycoplasma hominis e Ureaplasma urealyticum , Mobiluncus , Megasphaera , Sneathia, Clostridiales, espécies Fusobacterium e Atopobium vaginae). No entanto, a Gardnerella vaginalis é a mais comum.
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Sintomas de vaginose bacteriana
Cerca de 50% a 70% das pacientes são assintomáticas. Dentre as sintomáticas, a sintomatologia clássica é:
- Corrimento esbranquiçado, fino e homogêneo;
- Odor desagradável (semelhante a “cheiro de peixe”) que piora após a relação sexual e durante a menstruação.
Isoladamente, a vaginose não causa disúria, dispareunia, prurido, queimação ou inflamação vaginal (eritema, edema). A presença desses sintomas sugere vaginite mista. Em casos mais raros, o distúrbio pode estar associado à cervicite aguda (secreção mucopurulenta endocervical ou sangramento cervical facilmente induzido)
Como é feito o diagnóstico?
Como os sintomas se sobrepõem aos de outras infecções vaginais, é necessário um diagnóstico preciso para orientar corretamente o tratamento. O corrimento vaginal é avaliado quanto à evidência de VB usando testes de pH com microscopia e/ou testes laboratoriais.
A coloração de Gram do corrimento vaginal é o padrão-ouro para o diagnóstico, mas é realizada principalmente em estudos de pesquisa porque requer mais tempo, recursos e experiência. Na prática clínica, quando a microscopia está disponível, o diagnóstico em mulheres na pré-menopausa é geralmente baseado na presença de pelo menos três critérios de Amsel:
- Corrimento homogêneo, fino, branco-acinzentado, que reveste suavemente as paredes vaginais;
- pH vaginal >4,5;
- Teste de cheiro de amina positivo, definido como a presença de odor de peixe quando uma gota de hidróxido de potássio (KOH) a 10% é adicionada a uma amostra de corrimento vaginal;
- Células indicadoras (“Clue Cells”) em montagem úmida com solução salina. Para um resultado positivo, pelo menos 20% das células epiteliais na montagem úmida devem ser células-chave.
Visualização do colo uterino com achado de conteúdo homogêneo, bolhoso e acizentado. Muito sugestivo de vaginose bacteriana. Fonte: Organização Mundial da Saúde
Os três primeiros achados às vezes também estão presentes em pacientes com tricomoníase, por isso, deve-se estar atento aos diagnósticos diferenciais (Tabela abaixo). Além disso, deve-se evitar o diagnóstico sem realização de exame especular!
Como a VB representa alterações complexas na microbiota vaginal, a cultura vaginal não tem papel no diagnóstico. O Papanicolau também não é confiável para o diagnóstico.
Tratamento para vaginose bacteriana
Pacientes com vaginose bacteriana confirmada que estão sintomáticas ou que serão submetidas a um procedimento ginecológico envolvendo a vagina (independentemente dos sintomas) devem ser tratadas! As pacientes assintomáticas não devem ser tratadas, visto que a disfunção é geralmente autolimitada.
O tratamento poderá propiciar alívio dos sintomas, redução de infecção pós-operatória e redução de infecções sexualmente transmissíveis. Além disso, o tratamento oral com o Metronidazol é eficaz na gestação e não foi associado a efeitos fetais ou obstétricos adversos.
A tratamento inicial da vaginose deve ser realizado preferencialmente com metronidazol ou clindamicina nos seguintes esquemas:
- Metronidazol oral 500mg 12/12h durante 7 dias | ou | Gel de Metronidazol 0,75% - 01 aplicador cheio com 5g inserido na vagina durante 5 noites
- Gel de Clindamicina 2% - 01 aplicador cheio com 5g inserido na vagina durante 7 noites | ou | Clindamicina oral 300mg 12/12h durante 7 dias
Outras medicações alternativas menos comuns incluem: Tinidazol, Secnidazol e Cloreto de Dequalínio. As taxas de cura com ampicilina e amoxicilina são medíocres. O ácido bórico não demonstrou ser eficaz no tratamento de casos isolados ou iniciais.
Embora a atividade sexual seja um fator de risco para a transmissão, os estudos até o presente momento não apoiam o tratamento de parceiros sexuais assintomáticos de indivíduos com VB confirmada, visto que não altera o desfecho do tratamento.
Aproximadamente 30% dos pacientes com respostas iniciais à terapia apresentam recorrência dos sintomas em três meses e mais de 50% apresentam recorrência em 12 meses. A explicação para esta elevada taxa de reinfecção não é clara. As pacientes com três ou mais infecções documentadas em um ano são diagnosticadas com vaginose bacteriana recorrente.
Se uma classe ou via de medicamento não tiver sido previamente prescrita, começamos com esse medicamento para tratamento da recorrência. Ainda, se o paciente já experimentou vários medicamentos no passado, repetimos o medicamento que pareceu mais útil ou foi mais bem tolerado.
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Ácido bórico e antibióticos
Supositórios vaginais de ácido bórico podem ser usados simultaneamente com tratamento antibiótico. Para esta abordagem, 600 mg de ácido bórico vaginal uma vez ao dia ao deitar-se é iniciado simultaneamente com o antibiótico e continuado por um total de 20 a 30 dias.
As pacientes são acompanhadas um ou dois dias após a última dose vaginal de ácido bórico; se estiverem em remissão, iniciamos imediatamente o gel de metronidazol duas vezes por semana, durante quatro a seis meses como terapia supressiva. A terapia é então interrompida assim que o tratamento for concluído.
Conclusão
A vaginose bacteriana é uma condição comum entre mulheres em idade reprodutiva, caracterizada por desequilíbrios na microbiota vaginal. O diagnóstico deve ser dado sempre que possível. O tratamento adequado, preferencialmente com Metronidazol, será essencial para prevenir complicações em pacientes sintomáticas e que serão submetidas a procedimentos cirúrgicos.
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