Por: Ellen Kosminsky
A angina estável é o principal sintoma da doença arterial coronariana (DAC) crônica. Sendo essa caracterizada pela presença de placas ateroscleróticas nas artérias coronarianas epicárdicas, ou seja, nas artérias descendente anterior esquerda, artéria circunflexa e na coronária direita.
O que é angina estável?
A angina estável é definida pela presença de um desconforto ou dor de caráter constritivo e localização retroesternal/torácica, podendo irradiar para a face anterior do pescoço, borda interna do braço esquerdo ou ambos os braços. Além disso, a angina pode ser desencadeada por exercícios, estresse emocional e pelo frio. E mais, por relações sexuais, após refeições copiosas ou após deitar-se, devido ao aumento do retorno venoso.
Para mais, o paciente obtém alívio da dor anginosa após o repouso ou uso de nitrato sublingual, sendo esse um vasodilatador seletivo das artérias coronárias. A angina estável comumente tem duração de 2 a 5 minutos, não ultrapassando 20 minutos. Caso o indivíduo apresente a angina por tempo superior a 20 minutos, deve-se pensar num provável diagnóstico de síndrome coronariana aguda (SCA).
A dor anginosa típica pode ser indício de quais patologias?
Os sintomas anginosos ocorrem por condições que provocam diminuição do oxigênio ao miocárdio, ou por condições que aumentem a demanda de oxigênio. Assim, as principais etiologias que podem cursar com sintomas anginosos são o hipertireoidismo, a toxicidade simpaticomimética (ex: uso de cocaína), a hipertensão e a ansiedade.
Bem como a cardiomiopatia hipertrófica, a estenose aórtica e a cardiomiopatia dilatada. E ainda, a taquicardia ventricular e supraventricular. E mais, doenças como a anemia, pneumonia, asma, hipertensão pulmonar, leucemia e a estenose aórtica também podem provocar sintomas anginosos.
Quais as causas?
Como citado anteriormente, a angina estável é decorrente de um desbalanço na oferta e demanda de oxigênio (O2) do músculo cardíaco. Dessa forma, a principal causa são as placas ateroscleróticas, que podem dificultar o fluxo sanguíneo para o miocárdio em situações de maior demanda metabólica.
A aterosclerose é uma doença inflamatória crônica da parede arterial. A artéria possui três camadas: adventícia, média e íntima. Comorbidades do paciente, como a dislipidemia e a hipertensão arterial sistêmica (HAS) irão provocar lesões nas células endoteliais da camada íntima do vaso, gerando uma reação inflamatória.
O vaso inflamado irá atuar absorvendo as lipoproteínas de baixa densidade (LDL-c) para a camada subendotelial. Após isso, os monócitos e macrófagos irão fagocitar esse lipídio e, dessa forma, formar as células espumosas. Observe a imagem abaixo.
Após isso, as células musculares lisas, provenientes da camada média das artérias, formam placas fibróticas ao redor das células espumosas, a fim de impedir que estas entrem em contato com o lúmen do vaso. Observe a ilustração abaixo.
Dessa forma, quanto maior a capa fibrótica, e menor o núcleo lipídico no interior dessa capa, mais estável será a placa aterosclerótica desse paciente. De forma análoga, quanto mais fina a capa fibrótica, e maior o núcleo lipídico, maior a probabilidade de rotura da placa aterosclerótica e, consequentemente, maior o risco de surgimento de uma SCA.
Já as placas instáveis apresentam maiores riscos de cursar com ruptura da placa, com consequente formação de trombos intramurais. Esses podem aumentar de tamanho rapidamente, ocluindo o lúmen do vaso e, dessa forma, provocando isquemia do miocárdio.
Assim, a fisiopatologia da angina estável foi, por muito tempo, atribuída a uma obstrução ≥ 50% ou mais das coronárias epicárdicas. Entretanto, com a utilização mais abrange de exames de imagem sofisticados, como a angiotomografia computadorizada, observou-que que muitos pacientes apresentam DAC mesmo sem nenhuma obstrução, especialmente indivíduos do sexo feminino.
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Fatores de risco
Diversos fatores de risco favorecem o surgimento da angina estável. Entre eles, o diabetes mellitus (DM) destaca-se como um importante fator de risco associado à doença coronariana aguda estável, aumentando consideravelmente o risco de eventos cardiovasculares em comparação com indivíduos não diabéticos.
Isso porque aproximadamente 30% dos pacientes com DAC terão diagnóstico firmado de DM, e até 70% dos outros, quando investigados com o teste de intolerância oral à glicose (TOTG), apresentarão diagnóstico de intolerância.
Por fim, para além do diabetes, outros importantes fatores de risco são a hipertensão arterial sistêmica (HAS), o tabagismo e as doenças autoimunes, como o lúpus eritematoso sistêmico e a artrite reumatóide. E mais, o histórico familiar de doenças cardiovasculares.
Quais os sintomas da angina estável?
Como anteriormente citado, os sintomas da angina estável correspondem a dor na região precordial ou retroesternal intensa, com irradiação para membro superior esquerdo (face interna do braço). Podendo também irradiar para membro superior direito, orelha e mandíbula. Dores que acometem a região acima da orelha ou abaixo da região epigástrica são menos sugestivas da angina típica.
Além disso, a dor anginosa é intensa e de caráter constritivo. É comum o paciente apresentar a mão cerrada na região do esterno (sinal de Levi). Além disso, é muito comum a dor associada a sintomas como náuseas e vômitos.
Entretanto, é importante reconhecer que, em pacientes idosos, do sexo feminino ou com demência, bem como pacientes transplantados ou portadores de DM, o quadro pode ser atípico. Por exemplo, a única manifestação da angina estável no paciente idoso pode ser o delirium.
Para mais, o exame físico do paciente costuma ser normal. Entretanto, é possível evidenciar o sinal de Frank no lóbulo da orelha, que é indicativo de coronariopatia crônica. Observe a imagem abaixo.
Para mais, é possível classificar a gravidade da angina do paciente de acordo com a classificação da Canadian Cardiology Society (CCS). Observe a tabela abaixo:
Diagnóstico
O diagnóstico da DAC crônica é clínico, e é realizado no paciente que tem sintomas anginosos claros e fatores de risco relevantes. Todavia, exames complementares são importantes para a confirmação desse diagnóstico, bem como para estratificar o risco de mortalidade no paciente com sintomas anginosos típicos.
Dessa forma, ao avaliar o paciente com angina típica, deve-se solicitar o LDL-c, HDL-c e triglicerídeos (TGC). Bem como a hemoglobina glicada (HbA1c), glicemia de jejum (GJ) e função renal (uréia e creatinina). E mais, a troponina, que comumente vem sem alterações, e o BNP, a fim de avaliar possível caso de insuficiência cardíaca (IC). Por fim, solicita-se um ecocardiograma e um eletrocardiograma.
Para mais, para definir a probabilidade de existência de obstruções epicárdicas antes da realização dos exames complementares, pode-se utilizar a tabela de Forrester-Diamond. Essa tabela considera fatores como sexo, idade e se a angina é típica (estável) ou atípica (instável). Observe a tabela abaixo.
Assim, pacientes com baixa probabilidade de obstruções significativas (< 15%) não necessitam de avaliação com exames adicionais. Já pacientes com probabilidade intermediária (entre 15 e 85%) podem realizar o exame da ergometria ou da angiotomografia.
Por fim, pacientes com alta probabilidade (>85%) devem realizar a cinecoronariografia (CINE), que fornece imagens dinâmicas e permite a avaliação do coração em movimento. Por exemplo, de acordo com a tabela, um paciente do sexo masculino, com sintomas de angina típica e idade próxima dos 65 anos, apresentará entre 93 a 97% de chances de apresentar uma DAC crônica. Dessa forma, a CINE é recomendada.
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Como tratar o paciente com angina estável?
O tratamento consiste no manejo farmacológico e não farmacológico. Dessa forma, deve-se orientar o paciente sobre a importância da cessação do tabagismo, bem como a importância da realização de atividades físicas. Por fim, deve-se realizar também o manejo das comorbidades.
Tratamento farmacológico
Está indicado iniciar o uso das estatinas, independentemente do valor do LDL-c. Isso devido a propriedade que essa classe medicamentosa tem de estabilizar as placas de ateroma. E mais, orienta-se o uso de inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA), por ser uma classe que comprovadamente diminui a mortalidade nestes pacientes.
Para mais, deve-se prescrever o ácido acetilsalicílico (AAS) na dose de 75 a 162 mg/dia para todos os pacientes com DAC. E ainda, orienta-se que a meta de Hb1Ac dos pacientes com DM seja < 7%.
Tratamento antianginoso
Para o tratamento antianginoso, utiliza-se os betabloqueadores (BB) como tratamento de primeira linha; dando-se preferência aos BB cardiosseletivos, como o atenolol, bisoprolol e o metoprolol. Nesses pacientes, a meta da frequência cardíaca deve ser em torno de 50 a 60 bpm.
Entretanto, caso não seja obtido o controle dos sintomas da angina apenas com betabloqueadores, ou o paciente apresente alguma contraindicação ao uso desse medicamento, orienta-se o uso de bloqueadores de canal de cálcio (BCC).
O anlodipino e o nifedipino, BCCs dihidropiridínicos, promovem vasodilatação, e podem ser associados ao BB. Entretanto, BCCs não diidropiridínicos, como o verapamil e o diltiazem, não devem ser associados aos BB, visto que diminuem a FC.
Para mais, são indicados também os nitratos de ação rápida para combate dos sintomas anginosos. Sendo o dinitrato de isossorbida (isordil) utilizado para alívio rápido da sintomatologia anginosa.
Entretanto, deve-se ter cuidado ao administrar nitratos com medicamentos inibidores da fosfodiesterase, como o viagra, comumente utilizados em pacientes com DAC devido ao quadro de disfunção erétil. Isso porque o uso concomitante desses medicamentos pode provocar hipotensão no paciente.
Observe o esquema abaixo para o tratamento da angina estável. Caso o paciente não apresente melhora do quadro clínico de angina, mesmo após utilização do alopurinol, medicação de 4ª linha, deve-se considerar a realização do cateterismo.
Conclusão
A angina estável é uma condição muito comum. O seu reconhecimento, bem como sua diferenciação da angina instável e dos sintomas da síndrome coronariana aguda são de fundamental importância para o médico generalista. Dessa forma, reconhecer o quadro clínico, formas de diagnóstico e seu tratamento é crucial na prática médica!
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FONTES:
- FILHO, A. A. F., et al. Livro-texto da sociedade brasileira de cardiologia. 3ª ed. Barueri [SP]: Manole, 2021.
- MAHLER, S. A. Angina pectoris: Chest pain caused by fixed epicardial coronary artery obstruction. UpToDate. 2023. Acesso em: 15/02/2023. Disponível em:
- KUMAR, V. et al. Bases Patológicas das Doenças. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016
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