Por: Beatriz Lages Zolin
A morte encefálica é uma causa de morte na qual o paciente possui diversas funções orgânicas sem complicações (como coração e pulmão “saudáveis”), mas com o “desligamento” do cérebro e de sua conexão com o resto do corpo.
Sendo assim, os indivíduos estarão com o pulmão realizando trocas gasosas (permitindo homeostase para os outros órgãos) apenas se ligados a máquinas hospitalares, pois os músculos respiratórios não recebem mais comandos do sistema nervoso. O coração continua a bombear sangue, pois possui um sistema elétrico desvinculado do encéfalo.
Para declarar que um paciente teve morte encefálica há critérios rigorosos, estabelecidos por cada país, sendo necessário que todos os médicos capacitados no Brasil sigam os pré-requisitos do Conselho Federal de Medicina.
O que é morte encefálica?
A morte encefálica é a parada total e irreversível das atividades encefálicas, incluindo córtex e tronco encefálico. Sendo assim, não é possível o controle dos sinais vitais, mesmo que órgãos como coração, pulmão e rins estejam “intactos”. Ocorre principalmente por traumatismos cranioencefálicos, AVC extenso e lesão hipóxico-isquêmica pós-parada cardiorrespiratória.
O protocolo é iniciado quando o paciente tiver coma não responsivo, com escala de Glasgow ≤ 3, sem nenhum reflexo de tronco encefálico e apneia enquanto aparelhos de ventilação mecânica estão desligados. Devemos descartar todas as possíveis causas dessa condição que são reversíveis, como intoxicação, hipotermia, sedação intensa, anormalidades hidroeletrolíticas graves, distúrbios ácido-base importantes e crises endócrinas.
Como é feito o diagnóstico?
Os testes diagnósticos de morte encefálica devem garantir que o paciente está em coma não responsivo, em apneia persistente e ausente de reflexos de tronco, confirmados por 2 profissionais diferentes. Esses testes só podem ser realizados por médicos especialistas das áreas de Neurologia, Neurocirurgia, Emergência ou intensivismo (UTI) e ainda capacitados por mais 1 ano em morte encefálica.
Antes de realizar esses testes, o paciente precisa ser observado por 6h (24h em caso de lesão hipóxico-isquêmica) e estabilizado, quanto a temperatura, pressão e saturação de oxigênio. É necessário se certificar de que não há drogas supressoras no organismo do indivíduo, como barbitúricos.
OBS: para crianças menores de 2 meses, o tempo de observação para todos os casos é de 24h e para crianças entre 2 meses e 2 anos, o tempo é de 12h.
Nível de consciência
Primeiramente, avalia-se o nível de consciência do paciente através da escala de coma de Glasgow. As variáveis da escala são abertura ocular, resposta verbal e resposta motora, com escore normal 15 e escore de coma 3.
Reflexos do tronco encefálico
Os reflexos de tronco que devem ser avaliados são o reflexo fotomotor pupilar (analisa nervos cranianos II e III), reflexo córneo-palpebral (NC V), óculo-cefálico (NNCC III, IV, VI), reflexo óculo-vestibular (NC VIII) e reflexo da tosse (NNCC IX e X).
Reflexo fotomotor pupilar
A imagem demonstra como pesquisar o reflexo fotomotor. Ao colocar a luz, a resposta normal é que as pupilas se contraiam, mas em indivíduos cegos ou com morte encefálica, as pupilas permanecem em midríase.
Reflexo córneo-palpebral
A pesquisa do reflexo córneo-palpebral é feita com um pedaço pequeno de algodão na córnea, um indivíduo com morte encefálica não pisca os olhos com este estímulo.
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Reflexo óculo-cefálico
Ao mudar a direção da cabeça do paciente, a resposta normal é que os olhos rolem para ficarem direcionados ao ponto anterior. No caso de morte encefálica, ele apresenta “olhos de boneca”, pois os olhos ficam “vidrados” na direção que posicionar a cabeça.
Reflexo óculo-vestibular
Ao injetar soro fisiológico frio, a resposta normal é o movimento ocular para o lado do ouvido testado. Na morte encefálica, há ausência de respostas.
Reflexo de tosse
Para testar esse reflexo coloca-se uma cânula pelo tubo traqueal, que estimula a tosse, mas nos pacientes com morte encefálica não há resposta.
Teste de apneia
Deve-se colocar o cateter nasal fornecendo O2 durante 10 minutos. Após isso, desconectar a ventilação mecânica (por 8-10 min) do paciente e monitorar o eletrocardiograma, a pressão e a saturação de oxigênio, além de coletar gasometria arterial antes e depois do teste.
A apneia é confirmada se na gasometria o valor da paCO2 for > 55 mmHg (ou aumento de 20mmHg da basal), com ausência de movimentos respiratórios. Vale salientar que esse teste não precisa ser repetido pelo 2º profissional, a não ser que no primeiro teste tenha evidências de arritmias, hipotensão ou saturação de O2 <85%.
Exame Complementar
Além dos testes acima, para a confirmação, é necessário 1 exame complementar, demonstrando ausência de atividade elétrica ou perfusão sanguínea cerebral. Os mais utilizados no Brasil são o doppler transcraniano e o Eletroencefalograma (EEG), mas também pode-se solicitar cintilografia, angiografia, angio-TC ou TC por emissão de pósitrons.
Conclusão
A morte encefálica é um diagnóstico complexo, com critérios específicos segundo o CFM e seus testes devem ser realizados por profissionais capacitados, avaliando nível de consciência (escala de coma de Glasgow), presença de reflexos do tronco encefálico e apneia persistente. Além disso, precisa solicitar pelo menos um exame complementar confirmando ausência de atividade elétrica ou de perfusão cerebral.
Muito importante conversar com os familiares dos indivíduos assim que houver suspeita do diagnóstico e avisar sobre o protocolo de morte encefálica, bem como avaliar sobre possível doação de órgãos.
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FONTES:
- PINHEIRO, Erick Marques et al. Incidência de protocolos de morte encefálica, captações e fatores que influenciam o processo de doação de órgãos em um Complexo Hospitalar Regional 2020
- Conselho Federal de Medicina 2017
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