O tromboembolismo venoso (TEV) é uma condição médica com potencial letal, que envolve a formação de trombos nas veias, com subsequente deslocamento e possível obstrução de vasos sanguíneos vitais. Assim, compreender os sintomas, o diagnóstico e as opções de tratamento do TEV são cruciais para os médicos, a fim de fornecer cuidados eficazes e reduzir a morbimortalidade associada a essa condição.
O que é tromboembolismo venoso?
O tromboembolismo venoso compreende duas entidades: a trombose venosa profunda (TVP), caracterizada pela oclusão do território venoso, sendo mais comum o acometimento dos membros inferiores; e o tromboembolismo pulmonar (TEP). Esse último é uma complicação potencialmente fatal do desprendimento de trombos em territórios venosos, sendo caracterizado por oclusão de artéria pulmonar.
No Brasil, a prevalência do TEP é de 3,9 a 16,6% na população geral. Em estudos com necropsias, a embolia pulmonar foi evidenciada em 9% dos pacientes com mortes por insuficiência respiratória. E mais, cerca de 50% dos pacientes com TVP apresentam TEP associada, sendo essa, em geral, assintomática. Para mais, nos pacientes com TEP, o TVP é diagnosticado em 60% dos casos.
Fisiopatologia
O tromboembolismo venoso é o resultado de uma complexa interação de três componentes, denominados Tríade de Virchow: lesão endotelial, estase sanguínea e hipercoagulabilidade. Assim, a lesão endotelial pode ser desencadeada por traumas, inflamações, procedimentos cirúrgicos ou doenças vasculares subjacentes.
Tríade de Virchow. Fonte: Vascular.pro (https://vascular.pro/triade-de-virchow/)
Esse processo facilita a exposição do subendotélio vascular, ativando as plaquetas e fatores de coagulação. Já a estase sanguínea pode ocorrer em situações de imobilização prolongada, de insuficiência cardíaca congestiva ou obstrução venosa. Essas situações promovem o acúmulo de componentes coagulantes.
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Quais os sintomas da tromboembolia venosa?
Os sintomas da tromboembolia venosa podem variar em intensidade e apresentação, dependendo da localização e extensão do trombo. Ela frequentemente manifesta-se com edema, dor, sensação de calor e eritema na área afetada. No entanto, é importante notar que nem todos os pacientes apresentam todos esses sintomas simultaneamente.
Assim, são sinais clínicos presentes em 50% dos pacientes o sinal de Homans, o edema assimétrico - maior na perna acometida - o eritema e a dor localizada no trajeto venoso. Sendo o sinal de Homans a presença de dor ao se realizar a dorsiflexão passiva do membro acometido. Assista o vídeo abaixo para aprender como pesquisar o sinal de Homans corretamente.
Já na embolia pulmonar, o quadro típico é a dispneia de início súbito ou subagudo, taquipneia e dor torácica, estando pelo menos um presente em > 90% dos pacientes. Além disso, o paciente também pode apresentar dor pleurítica, que ocorre devido irritação pleural pela isquemia do parênquima pulmonar, sendo muitas vezes acompanhada pela hemoptise.
Para mais, o paciente também pode apresentar síncope (15%), hipotensão e saturação baixa. Isso indica comprometimento do sistema cardiovascular, caracterizando pior prognóstico e maior mortalidade para o paciente.
Como diagnosticar o tromboembolismo venoso?
O diagnóstico preciso do tromboembolismo venoso é fundamental para evitar complicações graves e oferecer tratamento oportuno. Entretanto, devido à clínica muitas vezes inespecífica e oligossintomática, o diagnóstico pode ser dificultado.
Trombose venosa profunda
O escore de Wells facilita a avaliação da probabilidade clínica de TVP.
Tromboembolismo pulmonar
O escore de Geneva é utilizado para determinar a probabilidade de tromboembolismo pulmonar.
D-dímero
O D-dímero é um produto da degradação da fibrina, e sua presença em níveis normais tem alto poder de exclusão de TEV. Entretanto, esse marcador não é específicopara o problema, podendo estar aumentado em situações como infecções, neoplasias e inflamações. Por isso, valores altos de D-dímero não são específicos para essa condição.
USG de Doppler Venoso
A Ultrassonografia de Doppler Venosa é frequentemente utilizada como método inicial para confirmar a presença de TVP, permitindo a visualização direta dos trombos e a avaliação do fluxo sanguíneo. Tem sensibilidade > 90% e especificidade > 95%, e substitui a venografia por causa da maior disponibilidade.
A USG avalia veias femorais e poplíteas (veias proximais) e o trajeto venoso da panturrilha. Em 90% dos casos, as embolias pulmonares têm origem nos membros inferiores, geralmente devido a tromboses proximais, portanto, o achado de trombose venosa profunda proximal em pacientes com suspeita de tromboembolismo pulmonar é suficiente para início de anticoagulantes, sem necessidade de prosseguir com a tomografia computadorizada.
Angiotomografia Computadorizada
No caso de EP suspeita, a Tomografia Computadorizada (TC) de tórax com contraste é um exame-chave para identificar obstruções vasculares pulmonares e avaliar a extensão da lesão, identificando até mesmo ramos subsegmentares pulmonares. Observe a imagem abaixo, que demonstra em TEP maciço, ou seja, uma oclusão bilateral das artérias pulmonares.
Como tratar a tromboembolia venosa?
Os anticoagulantes, medicações preconizadas no tratamento do TEV, não irão atuar dissolvendo o trombo, mas sim, diminuindo seus riscos de progressão, reduzindo as chances de novos eventos. Assim, é o próprio sistema fibrinolítico endógeno do paciente que provocará a dissolução do trombo.
Por isso, a anticoagulação deve ser iniciada o mais precocemente possível em todos os pacientes com tromboembolismo venoso, exceto se houver risco muito elevado para sangramentos.
As heparinas são frequentemente empregadas como tratamento inicial. Assim, a heparina de baixo peso molecular (HBPM), também conhecida como enoxaparina, é utilizada na dose de 1mg/kg em 12/12 horas, via subcutânea. Já a heparina não fracionada (HNF) tem uma farmacocinética imprevisível e, por isso, é necessária a dosagem do TTPa, com manutenção de seus valores entre 1.5 e 2.5.
Já as varfarinas, medicações antagonistas da vitamina K, podem ser iniciadas nas doses de 5mg/dia na maioria dos pacientes. Entretanto, devem ser associadas à heparina por pelo menos 5 dias no tratamento do TEV, devido ao seu efeito anticoagulante ter início após 36 ou 72 horas, com efeito pleno em até 5 dias. Assim, suspende-se a heparina quando o paciente atingir valores de INR entre 2 e 3 por 2 dias consecutivos.
Para mais, também pode ser utilizado para o tratamento da TEV os novos anticoagulantes orais (NOAC): os inibidores do fator Xa e os inibidores diretos da trombina. Devido a seu efeito imediato, os NOAC não devem ser utilizados em associação com as heparinas.
Assim, o tratamento do tromboembolismo venoso é constituído de três fases: a fase inicial, em que são iniciados anticoagulantes parenterais por 5 a 7 dias, em que comumente são utilizadas as heparinas, com posterior transição para a medicação oral. Posteriormente, há o período de longa duração, realizado durante 3 meses.
Ele consiste na continuação do uso das heparinas, como no caso das gestantes, ou em sua troca pela varfarina. Por fim, a terceira fase, caracterizada pela continuação desta anticoagulação por período extensivo, é avaliada de acordo com o evento agudo e presença de fatores de risco irreversíveis.
A anticoagulação por período extensivo ou indefinido é recomendada para pacientes com TEV sem fator de risco maior (ex.: fraturas de perna ou quadril, cirurgias ortopédicas, cirurgias de grande porte, traumas importantes, lesões medulares), em pacientes com fator de risco maior persistente (ex.: gestação, neoplasias ativa) e em pacientes com SAAF.
Na realidade da maioria dos hospitais brasileiros, o tratamento do TEV consiste na utilização da HBPM logo após o diagnóstico, com sobreposição da varfarina logo após o controle da anticoagulação oral (INR 2-3).
Entretanto, caso seja optado por realizar o tratamento com um NOAC, pode-se iniciar o tratamento da fase inicial com a apixabana ou a rivaroxabana de 5 a 10 dias. Isso porque, diferentemente da varfarina, seu efeito anticoagulante é imediato. Entretanto, a edoxabana e o dabigatran apenas podem ser iniciados após 5 a 10 dias do uso da HBPM.
Trombólise
Já a trombólise pode ser considerada em casos graves de TEP com instabilidade hemodinâmica. Assim, recomenda-se que seja feita quando houver pressão arterial sistólica (PAS) < 90 mmHg, ou quando houver queda > 40 mmHg na PAS por pelo menos 15 minutos. Assim, agentes fibrinolíticos são administrados para dissolver o trombo, exigindo monitoramento rigoroso.
Filtro de Veia Cava Superior
Por fim, o Filtro de Veia Cava Superior pode ser utilizado em situações em que a anticoagulação é contraindicada, ou quando recorrências ocorrem apesar do tratamento adequado. Esses dispositivos ajudam a prevenir a ocorrência de tromboembolismo pulmonat, entretanto, aumentam o risco de trombose venosa profunda.
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Profilaxia para o tromboembolismo venoso
O TEV é a principal causa de morte evitável em pacientes hospitalizados e, por isso, realizar a profilaxia adequada é fundamental. Assim, a profilaxia farmacológica é a primeira escolha, sendo feita a escolha pela utilização da HBPM na dose de 40 mg/dia, ou a HNF de 5.000 UI 12/12 ou 8/8 horas.
Ou ainda, pode-se utilizar o fondaparinux na dose de 2,5 mg/dia. Exceção são os pacientes submetidos a cirurgias ortopédicas, que devem utilizar o ácido acetilsalicílico (AAS), a varfarina ou os NOAC como primeira escolha para a profilaxia de tromboembolismo venoso.
Entretanto, quando o paciente não pode fazer uso dos métodos farmacológicos, é possível realizar métodos mecânicos para a profilaxia, como o uso das botas pneumáticas. Assim, a profilaxia deve ser mantida até a alta hospitalar, ou até o retorno da deambulação.
Por fim, para auxiliar nesta escolha, é possível utilizar os critérios de Padua. Quando a pontuação for ≥ 4, está indicada a profilaxia para o paciente. Veja a seguir:
Conclusão
O tromboembolismo venoso é uma condição médica que exige conhecimento profundo e abordagem clínica meticulosa. A compreensão da fisiopatologia, dos sintomas, do diagnóstico e das opções de tratamento é essencial para proporcionar cuidados de qualidade e prevenir complicações potencialmente fatais.
Continue aprendendo:
- Asma: fisiopatologia, tipos, sintomas e tratamento
- Hiponatremia: o que é, causas e sintomas
- Derrame pleural: etiologias, sinais e sintomas e tratamento
FONTES:
- LIP, G. Y. H., HULL, R. D. Venous thromboembolism: Initiation of anticoagulation. UpToDate. 2023. Acesso em: 30/08/2023. Disponível em:
- MARTINS, M. R. Manual do Residente de Clínica Médica. 2a edição. Barueri: Manole, 2017.
- FAUCI, Jameson. et al. Medicina Interna de Harrison. Porto Alegre: AMGH, 2020.
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